terça-feira, 13 de agosto de 2013

O JOGO DO BICHO,, Recife, cidade dos rios e sinais do além (Parte 6)


Recife, cidade dos rios e sinais do além



O JOGO DO BICHO e a colônia judaica do Recife - Parte 6

Paulo Lisker, de Israel

RECIFE CIDADE DOS RIOS E SINAIS DO ALEM.

A cidade estava cheia de "sinais" daqui e do além com tudo que era bicho.
Todos tinham certeza absoluta que o bicho que sonhou irá "dar" (sorteado) na tarde de logo mais.
Tudo nesta cidade era "sinal".
O fósforo não acendeu na primeira "riscada" é sinal, o cigarro apagou no meio era sinal, aguaceiro fora de época (como no Recife houvesse época pra chover), cavalo cansado de puxar carroça cheia de areia para construção caiu no meio da rua, visita imprevista do fiscal da higiene.
Minha Nossa Senhor dos Prazeres, tudo era sinal anunciando o bicho que daria hoje de tarde.
O ar estava tão carregado de "bichos" e seus sinais do Além que se podia cortá-lo como se fosse uma torta de chocolate numa festa de surpresa.
Lembro-me duma discussão entre os três irmãos Bondiers, moradores na Ilha do Leite, tentando decifrar o que significava ter visto um calango verde da cor do musgo em cima do muro quando eles caminhavam para a sinagoga no Beco do Camarão, ali defronte do cinema aberto Parque.
Discutiam os três, que bicho este calango significava ao relacioná-lo com aqueles bichos do jogo. Ele não estava ali pra mostrar o seu lindo colorido (mimetismo, desta espécie) aos que passavam na calçada. Aquele calango representava algum bicho do jogo, não tenham dúvidas.
Começava a discussão, um dizia vai dar jacaré, o outro dizia é cobra, o ultimo dizia macaco!
Como macaco? Tu estás cego, não vês que é uma "lagartixa verde"? Como isso pode dar macaco seu "goilem" (leso, em iídiche), ou tu não vês um calango em cima do muro cheio de musgos na casa da vizinha? (Musgo é feito um lodo que vegeta nos muros nas épocas úmidas e quentes, muito comum no Recife).
Vocês é que são uns bestas, eu vi dona Maricota a vizinha gorducha, estendendo roupa molhada no varal no quintal! Com certeza dará macaco. Eu só arrisco hoje o meu dinheiro em macaco e por vias das duvidas, apostarei também no porco, os "sinais" indicam claro estes dois bichos. Vocês vão ver! Dois "Groisse hahumen" (grandes sábios, em iídiche, deriva do hebraico e sempre usada como um pejorativo para quem se crê inteligente), só por assistirem as conferencias do bicheiro Saraiva, aquele charlatão, pensam que são "hahumen".
Continuavam a discutir até chegar ao "Shil" (sinagoga) e ali nem mais uma palavra sobre coisas fúteis como o jogo do bicho. Davam todo respeito ao senhor Lemle (o Gabé, responsavel pelo bom funcionamento da sinagoga. Palavra idiísh, derivada do hebraico "gabai") que dirigia as rezas do "minian" (no mínimo dez homens presentes para iniciar a sessão de reza diária) e que nem de longe permitia conversas mundanas.
Porém a conversa que se ouvia em toda a cidade, ricos e pobres, donos de comercio e empregados e até mendigos era sobre o jogo do bicho.
Este jogo se tornou o último reduto que crise econômica nenhuma derrubava.
Outro sinal positivo foi quando os judeus entraram na "jogada" (participar, derivado do futebol).
Diziam nas ruas e esquinas de conversa da Boa Vista: Se judeu está jogando e se tornou aficionado é sinal que é um bom negocio. Eles devem ter desvendado o "macete" (o método) ou se tornaram amigos dos "donos do jogo" e nem precisam adivinhar!
Ali tem dinheiro fácil dando sopa, então vamos lá nós também.
Com a participação dos judeus do Recife na sua grande maioria, aumentou mormente as apostas do dia e consequentemente a quantidade de dinheiro que rolava no jogo do bicho.
"Tu não sabes o sonho que tive esta noite, jogarei este bicho hoje e toda semana, vou ganhar um baú de dinheiro", dizia Marquito, satisfeito de si mesmo, gozava só em pensar no premio que imaginava receber.
Qual foi esse bicho compadre? Pergunta senhor Goldberg.
Ai "mehitn" (significa em iídiche cunhado, porém usado como "compadre" ou "amigo do peito"), amigos, amigos, negócios a parte. Não revelo nem para o senhor nem para ninguém, só posso dizer que é um bicho grandão e peludo.
Já sei, já sei, tu vais jogar no urso, diz seu interlocutor.
Pois eu sonhei com um danado que me arranhou e faz miau! Nele eu vou botar dois mil réis, tu vais ver se não ganho um bom "pedaço" esta tarde.
Patrício, tu podes jogar no teu gato eu irei no urso, a gente se encontra na Portinha da Água Soda no fim da tarde e quem ganhar pagará a bebida, concordas?
Claro patrício, com muito gosto e se despediam com um aperto de mão.
Entre judeus um aperto de mão valia mais que contrato escrito e assinado por dez advogados e reconhecido no cartório. Pelo menos no passado foi assim.
Para surpresa de todos, naquele dia deu vaca.
Onde por todos os santos estavam àqueles interpretadores de sonhos, todos eles são meros "pernas de pau" (termo copiado do ramo futebolístico).
Cada um dos apostadores pagou a sua bebida sem reclamar a má sorte e continuaram amigos, sempre discutindo política mundial e os palpites diários para as próximas apostas no jogo do bicho.
Diziam os gozadores da comunidade, se os grandes estadistas europeus se ocupassem de jogar no bicho, evitariam a grande guerra mundial e o desastre que ela causara no mundo todo.
Vejam que importância capital era dada ao jogo do bicho na comunidade judaica do Recife, mas não creiam que o resto da população ficava muito para trás.

FIM DA PARTE 6
03/3/2012
(Todos os direitos autorais reservados)

Um comentário:

  1. Dr. M. Rosenblatt Israel
    DISSE:
    "A SEXTA PARTE DO JOGO DO BICHO E A COLONIA JUDAICA DO RECIFE".

    Quando 100 burros apostam, vence uma vaca...

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