sábado, 10 de agosto de 2013

E DO GIBI, ALGUEM SE LEMBRA?


Lembranças da Praça Maciel Pinheiro


LEMBRANÇAS DA PRAÇA MACIEL PINHEIRO
Tema: E do Gibi alguém se lembra?
Paulo Lisker, de Israel

Do lado de fora da "PORTINHA da ÁGUA SODA", na Praça Maciél Pinheiro, assim à esquerda, na calçada, da esquina com a Rua do Hospício defronte da igreja da Matriz, estava uma armação de metal de cor verde do jornaleiro senhor Cândido.
Nela ele pendurava e amontoava os jornais do dia e revistas diversas.
Para nós os miúdos, ela foi a nossa biblioteca publica.
Não tanto pelos jornais da cidade, mas como pelo Gibi (revista infantil em quadrinhos) que saía toda semana e a comprávamos religiosamente toda quarta feira por um cruzado (quatrocentos réis).
Ao terminar de ler e se a revistinha estivesse em boas condições devolvíamos ao senhor Cândido e ele por cada seis revistas nos devolvia um cruzado e lógico que logo comprávamos a revista que chegara nesta semana. Boa gente este senhor Cândido.
No fim de cada mês saía o Gibi Mensal, para nós uma fortuna, 1500 réis.
Esta "obra de arte" (o Gibi mensal) foi sempre um presente da minha mãe, pelo bom comportamento ou boas notas que as professoras dona Eulina e dona Rinelia da escola primaria Hebreu Brasileiro, me regalava.
Era praxe mandar no boletim mensal um índice (A, B, ou C.) de comportamento do aluno. Assim sabiam nossos pais como estávamos dando os nossos primeiros passos na escola.

Nesta "banquinha" do jornaleiro, tivemos a oportunidade de conhecer a revista "O Cruzeiro" que publicava uma "charge" que todo Brasil conhecia, o "Amigo da Onça" de Péricles, sempre muito engraçado e satírico!

Mas para nós, a meninada, o Gibi era o máximo!
Juro que aprendemos a ler muito mais rápido com a ajuda das "estórias em quadrinhos", que buliam com nossa imaginação, do que na escola.
Desenvolvíamos a imaginação, mais que em qualquer curso altamente especializado de hoje.
Identificávamos com os personagens famosos do Gibi, tais como:
Bronco Pilar, Tim e Tom (os marujos), Pafúncio, Dr. Valdare, Brucutú, Flash Gordon, O Sombra, O Super Homem, A Tocha Humana, Popeye e Serafina, O Zorro, Capitão América, O Vingador, e muitos outros!
Mesmo que eles fossem americanos, nos já os tínhamos há muito tempo naturalizados brasileiros.
Já não me lembro bem quem eram especificamente os "heróis" do Gibi semanal e os do fim do mês, no Gibi Mensal.
Alguns deles só apareciam no Gibi mensal e não no semanal. Estratégia de venda da época.

Sei que no "mensal" aprendíamos muito com os comentários escritos em linguagem simples para o nível da infância "Acredite se Quiser",
"Caleidoscópio", Inacreditável, O Impossível Acontece e outros que nos levavam como num "tapete mágico" aos distintos quadrantes do universo e lá absorvíamos conhecimentos e realidades dos lugares mais escondidos e afastados do mundo.
Quanto "pano de manga" o Gibi Mensal não contribuiu nas conversas da garotada todo fim de mês. A gente acreditava em tudo que era publicado como se fosse a própria Bíblia Sagrada.
Comum ouvir os meninos dizerem, que a fonte da informação duma noticia, das mais descabeçadas que fossem era: Saiu no GIBI!
Pronto, se saiu no Gibi, fim de discussão, pois era a "pura verdade". Que mais querem? Jurar por Deus?
Se saiu no Gibi não era preciso mais provas nenhuma. Valia muito mais que jurar por Deus com os dedos fazendo o sinal da cruz "isolado" nas costas, como era o costume para se livrar dos "castigos divinos".
Às vezes a estória era de uma lógica tão duvidosa que eu recorria a meu avô para tirar a "prova dos nove", lembram do primário, ou já esqueceram como tirar a prova dos nove (bonita danada).
Quando perguntava ao meu avô a "sumidade" da nossa casa, ele dizia em iídiche meio cínico: "Bist hagoilem, brasilianisher kop, dus is a piste mainse. Bist meshigue" (Ou seja: Tu és um tolo, cabeça de brasileiro nato que acredita nessas estórias pra boi dormir. Estás doido?).
Depois de receber a "segunda opinião abalizada" do meu avô aí então voltávamos a manter discussões fervorosas com os amiguinhos nas esquinas da nossa pracinha. "É ou não verdade que tem uns mamíferos que põem ovo feito galinha, será? Que tu queres, saiu no Gibi, quem é teu avô pra desdizer. Eu não tenho medo, vai, diz a ele, vai,vai! Se saiu no Gibi, então é verdade. Teu avô sabe mais que o Gibi???
Podem crer que depois de ler as estórias em quadrinhos, as discuções eram fervorosas e possibilitavam um aprendizado das coisas mundanas de uma maneira muito mais efetiva que nas aulas chatas de geografia, na escola.

Já depois, com mais idade, muitos garotos e rapazes não conseguiam se "desmamar" desta literatura barata.
Quando pegávamos um destes rapazes, que já tinham ideologia formada (em geral de esquerda), andavam nos meios artísticos de Abelardo da Hora, pichavam paredes, tinham entradas no xadrez da policia, lendo o Gibi, Virgem Maria!!!
A gente vibrava:
"Mas rapaz o que é isto? Tu lendo Gibi, não tens vergonha? Coisa para retardado toma jeito bicho! "
Em geral eles se defendiam ou se justificavam por estar lendo esta "literatura fútil", alegando que era uma leitura de "analise critica". Nós riamos e fazíamos dele gozação! -Tu metido a comunista, frequentas o atelier de Abelardo e ainda lê Gibi! Toma jeito "fresção".
Assim eram os "jovens comunistas", ou "você tem razão ou se explica"!
Voltando as coisas boas que o Gibi promoveu com os miúdos. Francamente, não sei por que aqueles que "bolaram" o Gibi, não receberam o Prêmio Nobel para a literatura infantil. Se existe isso, sei lá!

Estou falando serio, deveriam recebê-lo e merecidamente.
Isto pelo numero infinito de leitores, possibilitava conhecer noticias e fatos do mundo todo, incentivar a leitura, criar amizades, discussões amistosas entre crianças, troca de revistas daqueles que faziam coleção, uma verdadeira revista "educacional" daquela época e o mais importante: Nos ensinou a ler, aos pequenos moleques analfabetos.

Lembro-me de um amigo da infância que tinha uma coleção que valia uma fortuna.
Jovens de todo o Recife e do interior do Estado escreviam perguntando se ele tinha duplicatas para trocar por um ou outro exemplar que lhe faltava na coleção!
Não sei se no Brasil, a Academia de Letras ou outra entidade Literária séria deu algum prêmio ou condecorou merecidamente com uma "honra ao mérito" ao Gibi.
Um agradecimento aos seus escritores e desenhistas, mesmo post-mortem.
Se não deram foi uma lastima!
Falando serio quem não leu o "GIBI"?
Acho que naquele tempo todas as crianças do Brasil tiveram algum contacto com esta "revistinha" saudosa.
Até quem não sabia ler, se contentava em admirar os heróis que "ganhavam vida" desenhados nos quadrinhos da revista GIBI!
Pena, grande pena que hoje a diversão eletrônica "fundiu a cuca" das nossas crianças, transformando as em meros espectadores sem possibilitar a criança desenvolver sua imaginação em volta dos desenhos e se esforçando ao maximo para entender os seus heróis, "Bronco Piler". "A tocha humana" ou "O sombra".
Aprendiam a ler as frases simples para o nível infantil como era escrito nesta revista e desta forma praticar a leitura do que já aprendeu no bê a bá da cartilha, dando os primeiros passos da alfabetização escolar.
É isso mesmo, foi uma época que o vento levou e o mundo nunca retrocede, verdade seja dita e o GIBI se acabou, uma pena.

Paulo Lisker- Israel
10-01-2012
(Todos os direitos autorais reservados).

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