quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Quebra quebra contra os súditos do eixo


Quebra quebra contra os súditos do eixo

                                                        Foto Google Internt  Recife dos anos 40
"DAS CONVERSAS COM MEU AVÔ"

Tema: Guerra na Europa e Black Out no Recife.

PARTE 3 (Quebra quebra, contra os súditos do eixo).

Paulo Lisker, de Israel


O senhor, Zimilovich o pai de Jayme, meu companheiro de brincadeiras e traquinagem da infância era um dos poucos que tinha radio daqueles de 8 válvulas, sempre coberto com uma toalhinha toda bordada para evitar juntar poeira na "preciosidade". Ele pegava (sintonizava) até a BBC nos dia sem muita interferência atmosférica.
De posse de um "serviço de informação" desta natureza, ele nesta reunião no nosso terraço tomava a palavra e relatava com toda seriedade o que ouviu no "Repórter Esso" (a testemunha ocular da historia") e contava o conseguiu ouvir no Comentário de Emberé em português, nas ondas curtas da BBC.
Todos ficavam em silencio escutando as novidades por ele contadas e não menos pela inveja por ser o único que possuía um radio que "pegava" até a BBC. Coisa do outro mundo na época, pois era preciso uma antena grande danada por cima dos "pés de pau" que naquele tempo em Recife ainda estavam presentes, ademais era necessário um "fio pra terra" que deveria estar bem agarrado num cano de água da casa. Mesmo assim não havia garantia nenhuma que o tal radio por melhor que fosse "pegasse" estações estrangeiras, então se contentavam com as noticias divulgadas pelo "Repórter Esso", na Radio Clube de Pernambuco.
Podia-se sentir com que seriedade o pessoal no terraço escutava as noticias e só ouvia-se o zumbido das palavras de boca fechada surpreendidos do como o exercito alemão nazista estava derrubando um por um os exércitos dos países europeus,
Ouvia-se: "Oi vus vet zain fin Ivrope?" (Ai, ai, ai, o que será da Europa no fim dessa guerra)?
Depois de um breve silencio começaram a falaram sobre o "Quebra-Quebra" que o povo fez nas casas de comercio dos súditos do Eixo.
Alfaiatarias e lavandarias dos italianos (Fortunato Russo foi uma das vitima), porém muitas outra foram invadidas, espoliadas.
Logo depois chegou à vez dos japoneses. O mais proeminente era o sorveteiro Gemba (o melhor sorvete do Recife), em menos de meia hora de vandalismo não ficou nem a placa do estabelecimento, tudo foi jogado na rua e os moveis e outros apetrechos ficaram boiando no rio Capibaribe.
Não diferenciavam entre japonês e chinês, então coitados os súditos de Chang Kai Chek, também "comeram cacetadas" (pancadas em nordestino), vitrinas quebradas, até quando as engomadeiras crioulas do negocio, conseguiram explicar aos vandalistas a diferença dizendo que nariz achatado não é documento de identidade. Japonês é uma coisa e chinês é outra.
Assim é a natureza humana, um dia grandes amigos e no outro, inimigos ferrados. Assim é a guerra e a ignorância do povo local.
No fim chegou à vez dos alemães. Primeiro foram "acertar as contas" com os donos da Relojoaria e Joalharia Krauze, na Rua Nova. Loja de alto luxo. Aí sim tinham muito que roubar, imaginem!
Mas que surpresa, a "onda humana" ao aproximar-se da loja, se depararam com todos os membros da família Krauze nas portas do negocio e na calçada com cartolinas que diziam:
-"NÃO SOMOS ALEMÃES, SOMOS JUDEUS". FUGIMOS DE HITLER! SOMOS JUDEUS....
Até para a colônia judaica foi uma grande surpresa quando viram as fotos nos dois grandes jornais do Recife.
Eles nunca se declararam pertencentes a esta comunidade.
Quando por engano ou não, comitivas que angariavam donativos para as necessidades da comunidade judaica os visitava, nunca receberam deles um centavo para nada.
Era comum angariar de todos os judeus do Recife, cada qual segundo suas possibilidades donativos para manter em boas condições uma serie de inraestruturas físicas e sociais. Assim como: O cemitério judeu (tem disso, judeu é enterrado de uma forma que a religião dita e que exige esta "segregação").
Para as atividades culturais do Clube Israelita, para manter as duas sinagogas ou para as organizações de ajuda aos menos favorecidos, (o que hoje são as ONG), assim como, Relief, Wizo, Pioneiras, Vitka Kempner, etc. Para complementar o orçamento da Escola Judaica, e por final e não menos importante para a "Magbit" que coletava de uma maneira permanente dinheiro e roupa usada para ajudar aos recém chegados refugiados judeus da Europa na Palestina e concomitantemente fundar um Estado Judeu nesta terra que por tradição pertenceu ao povo de Israel.
Isto é o que se eles denominam, "A união faz a força" ou "Responsabilidade mutua".
Assim era o comportamento dessa comunidade no tempo do Recife matuto em que até "o boi voava".
Esta família Krause nunca se identificou como judeus, agora na hora do "pega pra capar": -SOMOS JUDEUS, SOMOS JUDEUS..... Esta é muito boa, viva, viva!
Aposto quanto quiserem ou como dizíamos quando menino: "Boto a minha cara ao bofete", que no dia que alguém dessa família venha a falecer então vocês verão o corre-corre pra fazer cumprir as exigências de todos os arranjos religiosos que regulam antes, no decorrer e no próprio enterro, acompanhado de todas as preces segundo a tradição ortodoxa judaica. Mesmo depois de morto, judeu quer "viver entre patrícios"!
Vocês todos sabem que se pode contar na palma de uma mão quantos judeus estão enterrados em cemitérios cristãos e por estes poucos diz à lenda, que "chora o profeta Ezequiel as beiras do Rio Eufrates".
O mesmo aconteceu no Hospital Radiológico Alemão, na Rua Manuel Borba defronte do Hotel Central. O único que era especializado neste ramo no Recife e tratava em geral de estrangeiros que viviam ou trabalhavam para firmas européias que prestavam serviços no Estado e no nordeste em geral.
Já todas as vidraças das janelas e pedaços das portas estavam jogadas na calçada, começaram a atear fogo na única ambulância que possuíam. A gritaria era enorme, "nazistas, criminosos, filhos da puta" e daí para mais.
Neste exato momento quando as coisas estavam ficando pretas, saíram os diretores e alguns médicos gritando:
-"SOMOS JUDEU, SOMOS JUDEUS", SÓ O NOME DO HOSPITAL E O EQUIPAMENTO PARA O TRATAMENTO DO CÂNCER É DE FABRICAÇÃO ALEMÃ!!!!!! NÓS SOMOS JUDEUS, NÃO ALEMÃES.... 
Foi assim também que eles se salvaram do "Quebra-Quebra" promovido pelos vandalistas.
Numa hora dessas o "abra cadabra" SOMOS JUDEUS era um passe mágico para se salvar de uma ruim!
De passagem arrebentaram a faixada do "Armazém Alemão" a casa de brinquedos, a melhor e a mais bem surtida do Recife e quem sabe, de todo nordeste). 
Ainda não saciados, começaram a depredar as alfaiatarias italianas do Recife, foi uma coisa horrível, toda a mercadoria e ternos prontos foram jogados na rua, milhares de botões dos mais diversos tipos e tamanhos, rolavam pelas ruas. Nós os pixotes saiamos a coletar os botões para nossos "times de jogo de botão", apesar de minha mãe alertar para que num tempo desses não puséssemos nem a ponta do nariz na rua, pois era muito perigoso cair na mão desses vandalistas!
O "quebra quebra" foi uma verdadeira "festa" para gente frustrada por qualquer coisa e que tiravam a sua raiva em cima do couro dos súditos do eixo.
No terraço a discussão estava animada, aí minha mãe mandou colocar mais bolachas e fatias de goiabada Peixe, me puxou pela orelha e ordenou: Vai dormir menino, amanhã tem escola! (aula).
Mãe, a coisa está tão animada, estou aprendendo muito mais do que nas aulas de geografia de dona Rinélia, que são chatas pra chuchu, me deixa ficar mais um pouquinho e logo mais vou pra cama, prometo, vai mãe, deixa! Ela olhou para meu avô viu no seu olhar o consentimento e no fim ela me deixou no meio dos homens e os cubinhos de açúcar que eu tanto gostava e de vez em quando dava umas investidas e roubava um ou outro. Bom danado, apesar do meu pai viver dizendo que isto "fura" os dentes. Agora entendo por que os velhos amigos do meu avô são banguelos, eles com certeza quando crianças também gostavam de chupar lá na terra deles esses cubinhos de açúcar.
Para mim miúdo a conversa dos "bebedores de chá" estava mesmo arretada, o diabo é quem vai dormir logo agora, que mãe se dane!
(Todos os direitos autorais reservados).

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