A Praça Maciel Pinheiro no Bairro da Boa Vista no coração do Recife, no passado.
Foto: Google-Internet
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"UM AMOR
IMPOSSÍVEL" (Novela)
TEMA: "POR
ONDE ANDARÁ DADINHO". (parte 2)
(BORRADOR)
Paulo Lisker
Israel.
Uma bela tarde
Dadinho saiu da pensão cabisbaixo e ao passar pela praça se deparou com
Abrãozinho sentado num banco lendo o Jornal Pequeno.
Este rapaz judeu,
também era estudante de Direito e ia à pensão, "virar as noites" com
os seus amigos e juntos se preparavam para os exames.
Abrãozinho era
considerado naquele tempo "uma ave rara" no meio judaico, pela carreira
que escolhera.
Não era comum entre
os judeus no Recife esta carreira profissional, e sim a de medicina, engenharia,
dentista, arquitetura.
Advocacia e agronomia eram carreiras menos atrativas e menosprezadas pelos rapazes judeus da cidade.
Advocacia e agronomia eram carreiras menos atrativas e menosprezadas pelos rapazes judeus da cidade.
Mas Abrãozinho,
estudar Direito já era demais.
Ele era filho único
de uma viúva paupérrima que vivia num sobradinho no Pátio da Santa Cruz. Um tio
dele, dono de um grande negocio de tecidos que vivia no Rio, enviava um
dinheirinho todo mês e se propôs também a financiar os estudos do sobrinho. Ele
resolveu advocacia e pronto. O seu tio não discutiu e aceitou a decisão do
único sobrinho que tinha e até se regozijava que a família teria no futuro um
"advocat" (advogado, em iídiche).
Dadinho conhecia
Abrãozinho da pensão aonde ele vinha estudar com os amigos e preparar-se para as
provas de fim de ano.
Escolher a carreira
profissional da primeira geração de judeus, aqueles já nascidos no Recife não
era uma missão fácil. Todos se metiam, davam opinião de entendidos, ("peruavam"),
mesmo que ninguém tivesse formação profissional alguma, todos eram em geral
vendedores ambulantes, emigrantes chegados da Europa, nem o idioma local
dominavam, porém sabiam o que era bom para esta nova geração de judeus nascidos
no novo continente.
Lembro meu pai
quando soube que eu iria fazer concurso para agronomia, em "Dois Irmãos"
(Subúrbio do Recife), me falou duro e dizendo em tom de repreensão:
-Isto não é
profissão para ganhar dinheiro. No final das contas tu estarás "Mexendo
com bosta de vacas e sempre atolado na lama e esterco de porcos"! Que
porcaria de vida será esta?
Perguntava de uma
maneira retórica e danado da vida com esta decisão do primogênito.
-Agronomia para
judeu, já viu? Ta doido (louco varrido, expressão popular).
Depois de alguns
anos também meu irmão seguiu este mesmo caminho então meus velhos pais quase
morrem de vergonha perante a comunidade judaica do Recife. Dois filhos, dois
agrônomos, (em iídiche nos taxavam de uma forma pejorativa de
"POIERIM", que significa "trabalhador braçal de campo" ou
agricultor), já era demais!!!
Quando depois de
formados, nós dois viajamos para Israel, sentiram-se meus pais mais aliviados,
pois não tinham que estar explicando aos conhecidos da colônia israelita a
causa que levou aos dois filhos enveredar "nesta profissão sem futuro
nenhum" para jovens judeus do Recife.
Diziam os amigos
nas conversas de fins da tarde na Praça:
-Meninos com tão
boa cabeça para as matemáticas, finanças, contabilidade e tudo que
tinha a ver com os números vai perder tempo estudando agricultura. Só louco!
Era uma indireta a meus
pais, os culpando pela maneira errada que nos educaram.
Penso que meus pais
e talvez toda nossa família nunca se recuperou do tal "desvio do caminho
normal" causado pela má educação que nos proporcionaram e consentindo que os filhos abraçassem o caminho
da enxada na agricultura como a futura profissão. Coitados, hoje sinto pena
deles!
Abrãozinho deixou
de ler o jornal e chamou a Dadinho para sentar com ele. Ofereceu-lhe um cigarro
"Caporal Lavado" (tinha essa marca naqueles bons tempos), os dois
fumavam e tinham o olhar parado no infinito.
O primeiro a romper
o silencio naquela tarde quente e sem vento de Dezembro foi Abrãozinho
(apelidado pela molecada de "Branquinha").
-Dadinho que melancolia
é esta homem?
-Se eu encontrar a
minha namorada, tu a conheces, a Xóxa, tudo passará. Desde que voltei do
interior não a vejo, nem ela nem a família, a quem eu pergunto pelo paradeiro
deles, ninguém sabe dizer nada. Tu por acaso ouviste algo, para onde esta gente
desapareceu, assim de repente e ninguém sabe de nada, não é mesmo para sofrer?
Isso está me roendo por dentro!
--Dadinho, deixa de
besteira, é só mulher, assim como ela têm muitas outras e ainda mais uma judia,
pra que tu procuras "sarna para te coçar"! Tu não sabias que esse
namoro só iria criar problemas e confusão?
Ficar assim
"murcho" sem gosto pela vida por causa de mulher...tas doido bicho!
Dadinho se zangou,
ficou puto com essa conversa e exclamou com raiva:
-Abrãozinho, tu
es veado, fresco safado de merda, tu não
gosta de mulher? Só não te dou umas bofetadas na cara por que es amigo de
estudos, mas senão tu ias ver...
-Não te afobes
Dadinho, eu não sou veado, eu sou teu amigo e quero te ajudar.
Te conto Dadinho, mais
tu me vais jurar por tudo que é santo para ti que nunca dirás a ninguém que
escutaste isso de mim, estamos de acordo?
-Desembucha
Abrãozinho, vai, nem mesmo a Santa Sé me queimando vivo, escutará de mim sequer
uma palavra, vai homem conta logo!
Abrãozinho e
Dadinho saíram da praça e foram se sentar no jardim do cinema Parque na Rua do
Hospício. Por lá teria menos curiosos e "abelhudos" (com as orelhas
direcionadas a conversa alheia).
Abrãozinho nesta
oportunidade contou tudo que sabia e tinha escutado do dia que Xòxá voltou do
interior até que viajaram para Bahia e todos os demais fatos que ocorreram
neste ínterim.
Dadinho suava frio,
só não desmaiou por que queria estar a par de todos os detalhes.
Abrãozinho
continuou contando ao amigo:
-Te digo mais, Xóxa
estava grávida quando casou na Bahia e se mandou para o Rio de Janeiro com o
seu maridinho judeu.
Esta foi demais
para Dadinho, agora ele tremia que nem "vara verde de marmeleiro" (um
raminho tenro de um arbusto), a boca acompanhava a tremedeira, assim também o
corpo todo, como se no Recife estivesse nevando.
De repente como
tivesse sido picado por um maribondo, ficou de pé e exclamou:
-De aonde você sabe
tudo isso? Como vou acreditar nessa estória louca?
Serenamente
Abrãozinho pegou na mão de Dadinho, puxou ele de volta para o banco e disse
sussurrando:
-Tu não sabias
que eu "trepo" (tenho relações sexuais), com a empregada novinha
deles? A empregada velha viajou com a família e quando voltou da Bahia contou
tudinho a Silvinha "mon amour"! Daí eu sei a estória toda, tudo "tin
tin por tin"( com todos os pormenores) do que ocorreu.
Daí pra frente não
sei mais nada, pois a família depois de curto tempo foi embora para o sul e as
empregadas foram com eles, pois lá é difícil encontrar gente fiel para este
trabalho. O casarão está agora ocupado pelos irmãos da Xóxa.
-Então Xóxa está
casada e de bucho meu, ai Deus me acuda, Nossa Senhora... Exclamou Dadinho
entre um soluço e outro. Despediu-se de Abrãozinho com um forte abraço e
desapareceu lá para o lado do Beco do Camarão e nunca mais foi visto.
Os colegas da
pensão depois de alguns dias deram parte a policia e comunicaram o misterioso
desaparecimento de Dadinho.
Abrãozinho contou o
que sabia ao delegado Mota que investigava o caso, acrescentou ademais que viu ele
tomar o bonde para Olinda.
A mesma coisa
relatou o bilheteiro do Cine Parque cujo poste de parada do bonde era defronte da
entrada do cinema.
Os amigos foram
para Olinda, procuraram nos bares onde ele costumava tomar seu
"traguinho" com os artistas e músicos que ali se reuniam, mas ninguém
sabia ou viu coisa nenhuma com respeito à Dadinho.
O único que deu uma
pista certa foi seu Silvino da barraquinha (quiosco) do Varadouro que vendia
refresco gelado das frutas da época. A clássica gelada de Mangaba, a melhor do
mundo era uma delas, inesquecível.
Ele relatou que
ontem ou ante ontem viu Dadinho sentado num banco com o Frei Bororó e depois de
um tempo saíram juntos de ladeira acima e sumiram na penumbra do anoitecer.
Correu o pessoal
para o seminário para falar com o tal Frei Bororó.
Pediram desculpa
pela hora, mais era um problema urgente que queriam pedir a sua ajuda.
O Frei relatou que este amigo deles veio pedir um conselho espiritual e no fim se confessou, não com
ele, porem com o padre Justino que é autorizado a tratar dessas coisas.
Foram procurar o
tal padre, mas o tema da confessão é segredo que nem a policia tem direito de
saber. Ele só pôde acrescentar que Dadinho ao se despedir beijou-lhe a mão e
disse que iria ver seus pais em Alagoas e pedir perdão.
O grupo de colegas
voltou para o Recife e no dia seguinte foram ter com o delegado da Delegacia da
Rua do Aragão e relataram as novidades que conseguiram coletar em Olinda.
O delegado Senhor Celestino
Mota logo se pronunciou que ele se encarregaria de telefonar para as
autoridades em Maceió. Eles lá já entrarão em contato com o delegado de
Palmeira dos Índios e com o coronel Monteiro o pai de Dadinho na fazenda
"Os Três Cipós".
- Agora as coisas estão nas minhas mãos, não se preocupem mais até que receba a resposta de Alagoas. Nós aqui continuaremos de alerta realizando buscas e investigações! Vão descansar meninada! Ordenou com um sorriso que revelava 4 dentes de ouro na dentadura do maxilar superior.
- Agora as coisas estão nas minhas mãos, não se preocupem mais até que receba a resposta de Alagoas. Nós aqui continuaremos de alerta realizando buscas e investigações! Vão descansar meninada! Ordenou com um sorriso que revelava 4 dentes de ouro na dentadura do maxilar superior.
A resposta ao
telegrama do delegado Mota chegou rápido:
Dadinho não chegou na fazenda dos seus pais e possivelmente nem viajara para Maceió.
Agora as coisas se
complicavam, até o Secretario de Segurança do Estado se meteu, exigindo maior
perseverança nas buscas e investigações e que guardassem sigilo conquanto aos
resultados intermediários.
Os colegas não
esperaram muito, juntaram um dinheirinho e publicaram nos 3 jornais da cidade
um aviso que pedia que Dadinho desse um sinal de vida, pois eles estavam
deveras preocupados. E não era para menos, pois isso não era comum nesse grupo
de estudantes em que um vivia "agarrado" com o outro, era como diziam
de brincadeira: "Vivem feito cachorros, um cheirando o cu do outro",
maneira de se expressar entre amigos íntimos.
Fim da parte 2 do
capitulo "POR ONDE ANDARÁ DADINHO" (novela) Um amor impossível.
Paulo Lisker
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Cuidem dos créditos