quinta-feira, 24 de julho de 2014

Triunfo, a chegada ao Ipê Roxo (Parte 2)


                                Exemplares da arvore IPÊ em plena floração.
                                Fotos: Google-Internet
"UM AMOR IMPOSSÍVEL." 
                                             (Paulo Lisker, Israel.)


 Tema: Triunfo, a chegada ao Ipê Roxo (Parte 2)

Agora falava o coronel.
- Ele disse que sabia do problema criado com os pais de Abelardo em Alagoas e que não lhes foi dado à bênção para o noivado e futuro casamento.
É uma pena perder um filho e uma nora por besteira de religião, acrescentou filosofando.
Agora escutem meus jovens, vou perguntar a vocês como é meu nome, sabem? Vai digam...
Respondeu  Abelardo: Segundo vi no envelope que lhe mandou meu pai estava dirigido ao Coronel  Ivo Barbosa deve ser este seu nome, não é?´
-Oficialmente, este é o meu nome, respondeu o coronel: Coronel Ivo Barbosa, certo.
Porem agora vocês vão saber o meu verdadeiro nome de Família.
O nome da minha família foi no passado longínquo na Grécia ou Turquia, não posso vos dizer exatamente, pois tudo isso era segredo dos antepassados e não se falava dessas coisas abertamente, nem para os familiares jovens.
A nossa família era no passado longinquo descendente de judeus, o nome era "BARBUR" que significa Cisne em hebraico.
Um tempo pensaram mudar para Cisneiro, porem no final resolveram Barbosa, lembra muito mais o nome original Barbur.
Tudo isso para fugir das perseguições anti-semitas da igreja na Europa e em geral no velho mundo, naquela época. De hoje para amanhã resolveram abandonar tudo que tinham.
Era gente de posse e tinham até terras, coisa não muito comum entre os judeus da época.
Primeiro chegaram as Antilhas e de lá para Colômbia e Venezuela e no fim desta correria chegaram ao Brasil.
Foi meu avô que achou de vim se instalar em Triunfo, pelo clima, eu acho, e as boas terras.
Quando contei este fato a Genoveva ela também ficou meio apavorada, pois a educação católica que recebeu quando criança, ali juntinho do Papa no Vaticano, deixou marcas serias na alma tenra  dela, quando menina.
Expliquei com paciência, tudo que lhe contaram sobre os judeus, jogarás amanhã na lagoinha! É tudo mentira, eu não tenho chifres, nem rabo entre as pernas, não uso sangue de crianças cristãs no meu "pão da páscoa", e principalmente não matei Jesus, é tudo uma grande mentira. Foi à igreja quem espalhou este boato satânico e por isso, estas perseguições e matança bárbara de judeus pelo mundo afora.
Nunca mais falamos sobre o assunto, nem com nossas duas filhas e nem com ninguém.
Aqui não vem sacerdote nenhum tomar café da manhã como na casa de teus pais em Alagoas.
Eu com a igreja não quero mais negocio nenhum.
O ultimo contato que tive com eles foi por insistência de Genoveva, para casar na igreja e a primeira comunhão das nossas filhas e pronto e daí pra frente nunca mais.
Nem aos domingos vou à missa. Genoveva vai quando Ramiro está no sitio, é só!   
Bom minha gente, daqui a pouco os galos começarão a anunciar que a madrugada está à porta, então vamos dormir, muito boa noite e até amanhã. 
Dona Genoveva tirou as coisas da mesa do alpendre, apagou os candeeiros, chamou os dois cachorros, Tupi e Cacique pra dentro de casa, trouxe um cobertor de lã uruguaia para o vigia Pedro Chico se agasalhar do sereno da madrugada.
O velho vigia cuidava da casa durante a noite, ainda no tempo do pai do coronel.
Era necessário pois todo o interior do nordeste se lembrava muito bem do Cangaço de Virgulino Lampião e Maria Bonita.
Ficou o costume de vigiar de noite, fosse preciso ou não!

Eram somente 22h e 30 minutos. No interior do nordeste já é alta noite, também a madrugada desperta com a cantiga do galo pois no campo as fainas diárias obrigam a um estar desperto, já bem cedinho.
No dia seguinte depois do café saíram na charrete o jovem casal mais o coronel, foram em direção a  vila e se instalaram na pensão de dona Raimunda, viúva de outro coronel, Dão Capistrano Celestino, que morreu no mato mordido por uma cobra Jararaca e como demorou um bocado pra chegar ao Posto de Saúde, não foi mais possível salva-lo. 
Pena, um homem muito instruído e positivo,  um tempo apoiava a Juarez Távora e depois o brigadeiro Eduardo Gomes.
Dona Raimunda fez da casa enorme onde morava, uma pensão e assim pôde, alugando quartos continuar a sua vida honestamente.
Pelo clima agradável de Triunfo, a pensão estava quase sempre com lotação esgotada, com "turistas" e convalescestes que vinham de outras partes do Estado, principalmente do Recife.
Já instalados no melhor e mais arejado quarto da pensão, saíram os dois mais o coronel, fazer uma visita ao prefeito e conhecer de perto o diretor da escola e o encarregado do DNOCS, onde Susana seria uma das secretarias.
Agora começaria o novo capitulo do jovem casal que vivia "amigado" sem problemas por parte de ninguém.
Estavam eles redondamente enganados, coitados.
Servia na Matriz de Triunfo, um padre destes "chatos" que vivia "enchendo o saco"  e que não achava correto um casal viver sem casamento. 
- Isso é libertinagem dizia ele nos seus sermões.
Sempre voltava ao assunto sem lembrar especificamente de quem se tratava, mas toda cidade já sabia que na pensão de dona Raimunda morava um casal de "amigados" do Recife, que não pensam em casar e acham que viver assim, é que é bom mesmo.  
- O pior é que ele será professor na escola municipal e educador de nossas crianças, e ela secretaria terá que fazer as contas dos prejuízos da seca de nossos fieis cristãos, os agricultores, ta vendo né? Fuxicavam as beatas na igreja.

Com o tempo as coisas se aquietaram, Abelardo fazia um trabalho espetacular com a meninada, o diretor não tinha palavras suficientes para tanto elogio.

As professoras casadas e solteiras, todo tempo querendo "tirar linha" ( namorar, na língua da terra) com o rapaz da cidade grande. 
Diziam as fuxiqueiras (em todo canto elas existem), tinha entre elas que sonhavam em ir para a cama com ele pelo menos uma vez na vida, se fosse possível, mais vezes, melhor ainda.

Susana também ia de vento em popa, logo se adaptou.
O seu conhecimento nas matemáticas e o português da escola Normal do Recife lhe dava vantagens nos cálculos de percentagem das perdas de produção agrícola e também pelos muito bem redigidos relatórios encaminhados a comissão de pagamento do DNOCS. 
Tudo ia de vento em popa, passaram-se os dois primeiro meses, receberam na data certa os ordenados, não era muito, porem já era algo positivo para quem nunca ganhou um tostão na vida.

Aos domingos, os levavam para o sitio onde sempre tinham ótimas refeições, sucos de frutas do quintal, mamão, graviola, pitanga, e as vezes tinha até de manga rosa.
Cada domingo outra fruta segundo a estação agrícola de produção destas árvores fruteiras. 
Sempre serviam galinha ou pato acebolado, muito bem preparado ou galinha a cabidela (cozinhada no seu próprio sangue), ou um leitãozinho criado no chiqueiro do sitio e alimentado com o resto das comidas de casa.
Nunca o coronel comia estas especiarias ou carne de porco.
Talvez fosse algo ligado ao longínquo antepassado judaico da sua família que ficou arraigado no seu cerebelo. 
Nunca faltava uma farta salada de verduras da horta familiar e a especialidade da italiana dona Genoveva a macarronada com queijo parmesão ralado ou com molho de tomates grandes e vermelhos, também da horta familiar.
Na realidade eles também não podiam reclamar da farta comida que era servida na pensão da dona Raimunda.
 Porem todo dia feijão mulatinho com arroz ou talharim, pirão d água com carne de sol, raras as vezes bacalhau com macaxeira rosa, banana comprida cozinhada para o café da manhã, as vezes queijo coalho de Minas, ou marmelada da famosa fabrica "Peixe", era mesmo um cardápio de fartura.
A variedade era grande, não se podia reclamar.

A coisa marchava muito bem, começaram a fazer planos para o futuro.
Ele poderia ser nomeado diretor da escola daqui a um ano e meio quando o atual diretor se aposentaria.
Ela poderia ser nomeada secretaria chefe do gabinete do prefeito. Ambos obteriam muito melhor ordenado e grande influencia na comunidade, Abelardo, poderia até especular o cargo de prefeito.
Claro que pensavam em casamento e olhavam para comprar uma casa. Sobre os pais ninguém se aventurava a tocar no assunto, pois era um ponto delicado, porem ambos, sofriam com a situação criada.
Diz a crença popular: "NÓS FAZEMOS OS NOSSOS PLANOS E DEUS DÁ GARGALHADAS" (ditado hebreu)

Todos os direitos autorais reservados.
Cuide com os créditos.



N.B. Todos os fatos ocorridos em Triunfo foram relatados anos apos o acontecido e não testemunha ocular.
Alguns nomes são fictícios, pois a própria pessoa que relatou já não se lembrava mais deles.