SÁBADO, 29 DE DEZEMBRO DE 2012
Tem espião sacana informando
Tema: UM DETETIVE MIRIM
(Revisado em 01-12-2012)
Paulo Lisker, de Israel
PARTE 2 DE 4
-Pai, pelo amor de Jesus e Maria, olha ali parado encostado na estrada esburacada que vai da Boa Viagem até o Pina.
Olha bem direto, ali junto ao coqueiro “meio gogó da Ema”, ta vendo um carro?
-Menino, ta escuro, vamos embora já ta tarde!
-Pai olha bem, tu vês um carro, parece que é Studbacker, desses novos que chegaram ao Recife agora.
-E daí menino, quem compra carro novo é espião?
-Pai é pela maneira que está estacionado. Tu não estás vendo, o carro estacionado com o bagageiro voltado pro lado do mar e os faroletes dos breques (freios) em nossa direção, ta vendo?
-Estou. Ele pode estacionar como quiser, não tem lei que proíbe estacionar carro desse jeito, com a traseira voltada à praia.
-Eu sei pai, mas vê os faroletes do “stop” de cor vermelha piscando (cintilando, em nordestino), acendendo e apagando sem parar, repara homem, ele está transmitindo mensagens para algum submarino no alto mar.
-Agora mais essa. Tu entendes de Morse? Vamos embora, mais um pouco tua mãe vai pensar que algum de nós se afogou! Virgem Maria da Misericórdia, este menino ta é doido!
Amanhã te levo logo cedo ao Dr. Sampaio, que te faça um exame geral, eu sabia que esta merda de “escroteiro” ia te embrulhar os miolos, Nossa Senhora, larga o meu braço e vamos embora pra casa.
-O senhor é mesmo teimoso. Foi nos cursos de escoteiros que aprendi a transmitir mensagens com bandeirinhas, com som de telegrafo, tin-tin-tiiin ou ti tiiin, assim por adiante. Cada “tin, tin” desses, pai, tem um significado no alfabeto. Sei transmitir e decifrar também com o piscar da luz, foi a ultima coisa que aprendi, pois nos navios se usa muito este método, nunca viste nos filmes de guerra?
Eu sou campeão juvenil nisso, até ganhei uma medalha pelo evento feito na nossa sede no mês passado, tu estas falando com um “dunga” no assunto, me respeite! To brincando não pai. Serio, eu sei decifrar esta merda.
Já faz mais de meia hora que estou vendo este “filho da puta” nazista transmitindo mensagens, foi bom que o senhor chegou, pois eu não sabia mesmo o que fazer, ou pra quem contar, serio!
-Então o que diz este sem vergonha, vai dá-me lá uma idéia.
-Bom que tenho aqui o caderno que levo para as reuniões de escoteiros, está na minha mochila. Vamos lá, vou tomar nota do que ele esta transmitindo.
-E como ele faz isto, menino?
-Ele pisa no pedal de freio e segundo o tempo da luz vermelha acesa no farolete do "stop", ele manda a letra de cada palavra.
O pai dá uma gargalhada e diz:
-Tu tens certeza que ele não está com uma putinha que levou lá da "Estrada do Chupa" pra comer na praia. Uma mão na “moita” e o pé balançando em cima dos pedais do carro e segundo os piques do “serviço” que está recebendo ele vai compondo estas "mensagens" com os pés nos pedais?
Esta está boa demais, teu “suposto espião” está é trepando uma boa e o que vai sair da tua interpretação dos sinais será uma estória do Bocage.
Isto está mesmo muito gozado, Marcelinho o “escroteiro do mar” é o novo "caça espiões" do Recife, ta boa!
Tua mãe vai achar muita graça e vai até esquecer que está zangada contigo.
-Pai deixa de falar sacanagem e safadezas, se tu esculhambar comigo, eu juro que conto a mãe desse teu belo vocabulário comigo, que tenho agora só 12 anos.
Se o senhor quer saber mesmo, paizinho, ninguém “trepa” de motor do carro ligado. A gasolina está cara e racionada e não é nada cômodo trepar dentro de um carro fumaçando.
-Menino da peste como tu sabes que o carro está com motor ligado e funcionando?
-Tu já viste os faroletes dos “breques” (freios, na língua da rua) acenderem e apagar com o motor parado? Nunca na vida, só acende e apaga com a chave ligada e o motor funcionando, entendeu paizinho?
-Ta bem, ta bem, começa a apontar no caderno, vamos ver se sai alguma coisa que não seja “gala” (esperma em nordestino) pra todo lado, beijinhos, caricias, suspiros e outras coisas desta transa romântica na beira da praia. Tu não estás vendo que o que se passa naquele carro é um programinha e não espionagem? Vamos embora menino e deixemos estas coisas para quem entende disso.
-Pai uma hora atrás este desgraçado mandava um comunicado atrás do outro, foi aí que dei fé. Agora parou e se a gente esperar um pouquinho com paciência…. Olha, olha agora ele esta transmitindo de novo. Repara:
"G A U X O 22" (deve ser o código dele), "ZUM S S 99" (deve ser o numero do submarino).Ta vendo? Ta vendo? Eu não lhe disse. O senhor é muito teimoso, viu.
De repente pai e filho ficaram atentos olhando o “pisca a pisca” que vinha dos faroletes dos breques do carro. Começou uma nova transmissão e de repente parou no meio, pois alguém se aproximou da janela do carro, com certeza pedindo esmola. ou coisa assim.
O suposto espião saiu do carro e também a “putinha” como pai diz.
Atravessaram a estrada e foram sentar numa pequena barraca que vende “casquinhos de siri”, empadinhas de camarão, água de coco e cerveja Brahma.
Eles tinham que disfarçar o que de verdade faziam dentro do carro, pois amor não era mesmo.
Acho que foram descansar depois da “chupada” ou coisa que o valha, como suspeitava senhor Clodoaldo.
Marcelo quase choramingando pede ao pai:
-Vamos aproveitar o tempo que eles estão fora do carro e vai depressinha até o bangalô do seu Jorge no sitio do coqueiral dos Bortman. Pede para ele telefonar chamando a brigada militar que anda com aquela camionete que tem uma antena rodando no teto, procurando transmissões “piratas” (nome vulgar para transmissões clandestinas).
Assim procedeu senhor Clodoaldo o pai de Marcelo.
Marcelo ficou na tocaia, (esperando atento, em nordestino), olhando os breques do carro do espião caso novas mensagens, voltassem a ser transmitidas.
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Versão anterior postada na Fubana: 28-07-2011
Fonte do desenho "Espião", Inter
Fonte do desenho "Espião", Inter
Sra.Matilde Steinberg Recife
ResponderExcluirDISSE:
Caro Paulo
Li seu ultimo escrito e gostei bastante.
Acho interessante como você lembra as palavras que falamos aqui no Nordeste,principalmente em Recife depois de ter emigrado há tantos anos.Aprecio a maneira como emprega as palavras com as devidas explicações para quem não é daqui.
Pode crer que também me leva aos anos passados quando eu era uma adolescente. Parabéns. Acho uma delicia lêr suas lembranças.
Abraços
Matilde