SÁBADO, 5 DE JANEIRO DE 2013
Da série: "Das conversas com meu avô"
28-07-2011
Tema: “O CASO PIRILAMPO"
(Revisado em 01-12-2012)
Paulo Lisker, de Israel
PARTE 3 DE 4
O CASO PIRILAMPO
-De onde vocês pensam que eu conheço tão bem essa estória? Perguntou tio Jorge e enxugou o suor da testa, coisa muito comum no calor do Recife nesta época do ano.
Respirou fundo e continuou a contar o desfeche do acontecido a sua platéia no terraço da nossa casa na Rua Gervásio Pires.
-Caso o senhor Clodoaldo o pai de Marcelo não viesse bater na porta do meu “bangalô” onde veraneava naquela semana na praia da Piedade, nunca ficaria sabendo, pois, a censura militar proibiu toda e qualquer menção do caso, foi um “total calar de boca” e bem fechada.
Nada deveria chegar aos meios de comunicação e nem a ninguém, pois queriam “armar um alçapão” (armadilha em nordestino), para “fuder a cartola" (destroçar, na língua do povo), de uma vez por todas os submarinos nazistas nas nossas costas.
A intenção dos americanos no Recife era pegar de surpresa os espiões e continuar transmitindo informações falsas, e desta forma levar os submarinos para a uma área onde os aliados os esperariam para destruí-los de uma vez para sempre.
“Pelo Baependi”, filhos de uma grande puta!!!
Aqui entre nós, vocês sabem como denominaram este caso no arquivo do “S.C.E.M.”? (Serviço Contra Espionagem Militar). Alguém sabe? O documento que trata deste caso está “escondido” num arquivo secreto e é denominado “CASO PIRILAMPO”. Sabem o que é pirilampo? Não? Ninguém sabe? Vocês são mesmo uns ignorantes. É isso mesmo! Em iídiche é “gachliles ou faierflay”, já ouviram?
Pirilampo ou Vaga-Lume é aquele besourinho que ilumina de noite feito um “pisca-pisca” voador, já viram? É muito comum no mato.
-Seu Goldberg, meio hipnotizado se pronuncia em defesa do grupo dos "bebedouros de chá":
-Seu Jorge, nós não andamos no mato de noite é por isso que nunca vimos estes tais pirilampos ou os gachliles que o senhor agora contou pra nós.
-Então está explicada esta falta de conhecimento de vocês. Vou continuar a palestra. Estão aguentando?
Pois bem:
-Disse-me uma vez o nêgo Capitulino, aquele que o avô dele ainda foi escravo na fazenda Camaragibe e o seu pai se salvou com a “Lei do Ventre Livre”, que estes besourinhos com as "lanterninhas" á piscarem, eram as ultimas luzes que acompanhavam as almas dos miseráveis escravos á caminho do cemitério, o verdadeiro céu da eterna liberdade.
Quem sabe ele tinha razão. Os escravos morriam escravos, nem a promulgação da Lei do Sexagenário os redimia, pois morriam antes dos sessenta e como nenhum deles tirava certidão de nascimento, pior ainda. Nunca podiam provar pôrra nenhuma no que diz respeito à idade. Mas bonito que pelo menos os pirilampos os acompanhavam no seu ultimo caminho, em geral durante as noites, pra ninguém ver os defuntos destes negros serem enterrados num monturo dentro do mato da fazenda. Estória do "nego" capitulino, acreditem se quiser.
O pessoal no terraço nessas horas e nessa idade já estava tensos demais com a estória e já muito impacientes pediram para fazer um descanso para desengonçar a velha ossatura e urinar.
Sabem como é com gente velha, a bexiga enche logo de tanto chá, e a próstata incomoda pra cacete.
Ficou aquela fila na porta do único banheiro que tinha o nosso casarão. Casa do estilo português antigo, em que o penico era obrigatório em todo quarto ou sala de dormir, lembram-se?
Alguns septuagenários do grupo, aqueles de bexiga mais frouxa, e os mais corajosos, não esperavam na fila e se metiam entre as bananeiras no fundo do quintal e lá "vertiam água" (urinar na língua de povo educado). Na pressa de voltar a sua cadeira de vime, alguns deles esqueciam de abotoar a braguilha ou se urinavam nas calças. Ser velho é peia! (muito dificil, na lingua da rua).
Para nós, os meninos, o fundo do quintal era o lugar mais mal assombrado do mundo, durante o dia ainda tínhamos coragem de ir até as bananeiras, mijávamos e ainda nos regozijávamos de estar regando as plantas. Coisa de menino besta.
Mas de noite, nem pensar de ir até o fundo do quintal que estava pegado ao sitio de seu Ramos.
Chico “gaguinho” que também era escoteiro jurava por Deus (sem isolar) que ouviu o seu tio Djarbas, o guarda de transito (tinha disso no Recife), contar ao seu pai que o personagem fantasma mais famoso que estava escondido naquele sitio era o “Cavalheiro da Esperança”, Luís Carlos Prestes, com seu cavalo branco sem cabeça. Imagina.
Não tinha menino, nem os mais afoitos ou corajosos, assim como, (Meira Bucuar, Vivi Jacubovitz ou mesmo Julio "magro", que andava quase correndo em cima dos muros mais altos e afilados sem nunca cair), que depois das 8 horas da noite entrasse até o fundo do sitio ou do nosso quintal! Era mesmo de admirar, corajoso, corajoso, porém se "cagavam de medo" só em falar de entrar no sitio ao escurecer.
Tudo que se mexia, uma sombra que bulia na folhagem ou na parede, espantava toda meninada que logo “desembestava” (saia correndo as loucas, em nordestino) de volta para casa com um medo danado e iam logo dormir (sobre este sitio do senhor Ramos, já postamos neste blog 3 capitulos, quem quiser é só procurar e se deliciar com este pedaço da mata Atlantica no meio do Bairro da Boa vista, no Recife, agarrado (junto) ao nosso casarão na Rua Gervasio Pires).
Os velhos amigos do meu avô depois de 10 minutos com as bexigas vazias e próstatas serenas, retornavam para o terraço.
Para a surpresa de todos já estava em cima da mesa novos copos de chá fumaçando de quente (sempre com uma colherzinha em cada um deles). Um prato fundo cheio de bolachas Maria, outro com fatias de goiabada Peixe e queijo coalho (não pasteurizado, produto caseiro dos nossos sertanejos e que nunca ninguém morreu por isso).
Este produto, meu tio Jorge nunca esquecia de trazer quando voltava nas suas andanças pelo interior do Estado, assim como, também o "fumo de rolo" para as empregadas que parte da sua diversão era fumar (em cachimbo de pau) este fumo, produto artesanal do nosso homem do campo.
Minha mãe pediu ao seu irmão Tutcho (assim ela chamava o meu tio Jorge), que se desculpasse em seu nome para com as visitas, os amigos do meu avô, pois amanhã era dia de feira na Praça do “Peixe Boi” e ela mais minha tia, iria com as empregadas fazer feira logo cedinho, então já era hora dela se recolher.
Vizinho ao nosso casarão era outro casarão onde estava instalada a “Pensão Internacional”.
As janelas do seu primeiro andar davam para o nosso terraço.
Os hospedes em geral eram estudantes, músicos e gente jovem em geral.
De noite eles ficavam debruçados nas janelas não tanto pelo calor e a umidade do Recife, porém espiando interessados nestas reuniões de judeus reunidos naquele terraço uma ou duas vezes por semana.
Tenho certeza caso os diálogos fossem em português e não em iídiche, eles teriam interesse em saber o que este grupo de anciões discutia com tanto ardor.
Sei disso pelas conversas da minha tia Dina com o amigo Capiba (se não me falha a memória, o estimado senhor Lourenço da Fonseca) que durante um bom tempo lá vivia com outros músicos da Jaz Band Acadêmica.
Por mais de uma vez ele contou do seu interesse em saber sobre que assuntos discutiam naquele terraço debaixo do Jasmineiro e das Camélias.
Para encurtar a estória, continuou meu tio Jorge a contar o sucedido na praia de Boa Viagem.
Correu ele e o pai de Marcelo para o terminal de ônibus da Boa Viagem.
Acordaram o vigia o único que no seu quarto onde descansavam os choferes durante o dia, tinha um telefone fechado a cadeado. De noite só o vigia tinha direito de usar para casos de emergência, mas o coitado não sabia como fazê-lo.
-Dá-me a chave deste telefone, precisamos avisar a policia de um “acidente” ali perto da “Casa Navio”! Vai anda homem, é coisa urgente.
O vigia viu na cara dos dois que não adiantaria discutir dizendo que ninguém fora ele tem o direito de usar o dito cujo. Mesmo contra gosto abriu o cadeado, seu Jorge discou e pediu o Comissário.
Mandou o vigia dar uma volta onde estão estacionados os ônibus que partem para o Recife amanhã cedinho. Esperteza deste judeu, que não queria que o vigia ouvisse a sua conversa com o comissário.
Em poucas palavras ele contou as suas suspeitas e pediu que, por favor, avisasse ao serviço secreto americano sediado no Forte de Cinco Pontas e que pelo amor de Deus usem viaturas civis, sem sirenes e que o encontro seria na praça do circular da Boa Viagem.
-Combinado? Não demorem, pois tem alguém transmitindo mensagens para submarinos no alto mar. Traz pelo menos dois ou três gringos com experiência da “Tropa de assalto instantâneo” sem arma de fogo, caso estejamos enganados ninguém ficará ferido.
- Esta prosopopéia tem um fim até a madrugada? Pergunta senhor Shvalbmam bocejando à beça.
Fim da primeira parte do CASO PIRILAMPO.
Todos os direitos autorais reservados
Fotografia copiada do Google

Eng. Israel Coslovsky São Paulo Brasil
ResponderExcluirDISSE:
PAULO,
MUITO BOM, COMO SEMPRE. JÁ HAVIAMOS SIDO BRINDADOS POR UMA VERSÃO ANTERIOR, MAS A ATUAL ESTÁ MUITO MAIS ENRIQUECIDA DE DETALHES E FATOS.
OBRIGADO