terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Parte 3 -Final - Por onde andará Dadinho. Um amor impossivel (novela).

                                Olinda, casario da cidade, Pernambuco
                                     Foto Google-Internet

"UM AMOR IMPOSSÍVEL" (Novela)

TEMA: "POR ONDE ANDARÁ DADINHO".   (parte 3- Final)
                                                           
                                                                         (BORRADOR)
                                                                
Paulo Lisker
 Israel.

Na madrugada do dia 9 de novembro o delegado Motta veio às pressas a pensão e bateu forte na porta da entrada do casarão onde viviam os estudantes colegas de Dadinho,
-Abre a porta bando de vagabundos, levanta da cama seus molengas, acorda macacada!
- Quem é a essa hora da madrugada? Pergunta um dos estudantes ainda meio dormindo.
-Sou eu o delegado Motta, levanta cambada de preguiçosos, vocês não querem noticias do vosso amigo desaparecido?
Dentro da casa se ouvia um reboliço danado, era gente se vestindo e correndo pra cá e pra lá.
-Parece que acharam o Dadinho! Gritavam um para o outro enquanto se vestiam.
-Acharam o Dadinho, senhor delegado, onde acharam ele? Ele está bem?
Toda essa conversa ainda com a porta trancada.
O delegado já arretado com a demora deu uns socos na porta e quase a derruba.
-Achamos, achamos bando de "frescos" abram a porta e já!!!
Vocês vêm agora mesmo comigo ao necrotério do Derby para identificar o cadáver que foi encontrado no mangue nesta madrugada. Quem sabe é o tal amigo de vocês. Como é mesmo o nome dele? Gente se apressem o dia já está clareando.
Quando abriram à porta as primeiras que "caíram fora" (saíram), assanhadas, com uma tremenda cara de sono e se vestindo enquanto corriam para a rua, eram três ou quatro empregadinhas (domesticas) que trabalhavam nas casas vizinhas das famílias judias que de vez em quando depois de umas cervejinhas ficavam para dormir com os estudantes e como de costume logo bem cedinho voltavam para o "batente"( trabalho de empregada domestica).
-Gente, vamos rápido, levem a carteira de identidade ou mesmo a carteira de estudante. O chofer do "tintureiro" (viatura de cor preta que trás e leva presos para o xadrez), é quem vai nos levar ao necrotério, o coitado não dormiu a noite toda, atarefado com o caso do cadáver encontrado no mangue bem  pertinho da Avenida Cruz Cabugá, vamos gente, o sol já clareou,  já ta dia feito, vamos embora fazer o serviço!
Chegaram ao necrotério, já na porta os espera  o sanitarista e o médico legista.
Tiraram o cadáver da câmara refrigerada e apesar de estar muito mal tratado pela ação dos peixes carnívoros, caranguejos e siris, não restavam duvidas que o cadáver era mesmo do Dadinho.
-Vocês reconhecem o "dito cujo"? Averigua o delegado Motta com tom de voz autoritário e volta novamente e pergunta de novo.
-Olhem bem e digam logo, não temos tempo a perder. O médico legista necessita do cadáver para fazer a necropsia e elaborar o laudo da "causa mortem". Estou "falando grego"(linguagem incomprensivet) para estes estúpidos que amanhã serão nossos advogados, Deus me livre e guarde. 
Quem sabe ele foi assassinado antes de ter sido jogado no mar, entenderam "bestas ao quadrado" ou será que foi mesmo suicídio, vá lá saber o comportamento desses vadios que só vivem ou morrem para dar trabalho às autoridades da lei.
Você que está aí fungando, como reconheceu o cadáver do seu amigo? A cara está toda machucada e corroída pelos siris, como tu tens certeza que é ele mesmo? Olha bem de perto e não tapa o nariz, este cheiro não mata ninguém, vai seu fresco!
-Seu delegado, reconheci pelo brinco de madre perola na orelha esquerda do defunto, respondeu Bebeto. No Recife isto não é comum entre rapazes, só os "frescos" tinham um costume mulherengo assim. Bebeto enxugava as lagrimas com a ponta da manga da camisa de fustão amarelo.
Horas depois o laudo médico dizia claramente que o dito cujo praticou suicídio há tal hora, no tal dia e assim por adiante com todos os dados técnicos necessários para as autoridades fechar a investigação e o caso do desaparecimento do tal estudante.
O delegado Motta sibilava assim de baixinho: Não é para menos, eu estou puto da vida, já 3 dias que não sei o que é dormir numa cama, o secretario Plínio vive em cima do meu lombo (deve haver gente de importância cutucando na urgência deste caso, só pode ser por isso, toda essa pressa!
Na roda de amigos e do pessoal que frequentava a praça, ninguém necessitava de laudo médico coisa nenhuma, os boatos no Recife sempre foram muito mais rápidos que qualquer jornal ou estação de radio e só existia uma, a Radio Clube de Pernambuco (PRA 8), cujos estúdios não ficavam longe do local do acontecido, os manguezais que beiravam a Avenida Cruz Cabugá.
Possivelmente isto ocorreu logo depois que Dadinho se despediu do padre Justino na Praça do Varadouro.
Quase de madrugada, Dadinho saiu caminhando até a praia do Carmo ou a dos Milagres em Olinda e se jogou nos "braços de Iemanjá" e ali se afogou.
A maré arrastou o cadáver para longe (mar brabo danado neste trecho, muita gente com esta nefasta tendencia, escolhia esta praia para ir-se deste mundo). O corpo ficou encalhado no "manguezal" do aterro do caminho para Olinda, lá pros lados da Escola Aprendizes Marinheiros.
Depois de uns dias um "catador" de siris e caranguejos se deparou com o cadáver e avisou a policia.
Os pais de Dadinho foram avisados, vieram para o Recife e levaram o cadáver num avião 
bi motor de um amigo piloto aposentado. 
Em Alagoas foi realizado o enterro com a presença de um grupo de amigos da família de Dadinho.

"UM AMOR IMPOSSIVEL".   final da novela: 


(Borrador)

Paulo Lisker, Israel.

Tema: "ROMEU e JULIETA NO RECIFE MATUTO".  SAUDADES.



Estava eu sentado na Praça Maciel Pinheiro com senhor Sadigursky, judeu pobretão, um protótipo muito especial que vivia num quarto no "pé de escada" na praça, encostado a farmácia "Saúde".
Ele foi no passado mascate citadino, vendia bugigangas, escrevia musica de "kleizmer" (musica judaica das pequenas aldeias européias), era às vezes também maestro da Banda Acadêmica ou da orquestra da Policia do Derby quando estas eram contratadas para animar casamentos ou outra qualquer festividade no Clube Israelita. Até o famoso Capiba o conhecia e lhe dava as honras merecidas (a batuta de maestro).
Ensinava as rezas aos garotos judeus que comemoravam o "Bar Mitzvá" (ao cumprir 13 anos), eram considerados adultos pela religião judaica, com direitos de rezar e ler a "TORÁ, o Velho Testamento".
Era também um protagonista nas peças de teatro em iídiche e que ensaiadas no palco da sociedade israelita e apresentadas ao publico nas festividades da comunidade.
Em suma fazia de tudo, um verdadeiro "pau pra toda obra", como dizíamos nós os brasileiros natos.
Tipo baixinho, gorducho e feio, homem das mil profissões e nem um tostão furado no bolso ou um tostão inteiro no bolso furado!
Eu gostava de sentar com ele e conversar sobre qualquer tema, era um tipo versátil. Misturava o iídiche com português. Narigudo e fanhoso que às vezes eu pensava que ele ia se asfixiar se continuasse falando.
Eu ficava calado, só escutando as experiências da vida dele numa pequena aldeia no leste europeu, me contou que depois da guerra nunca mais teve noticias dos membros da família. Possivelmente foram exterminados nos campos de concentração nazistas na Polônia.
Num lapso da nossa conversa em que ele tomava fôlego, aproveitei e disse a ele que estava tremendamente frustrado, pois estava escrevendo uma crônica, relatando o caso amoroso de Xóxa a judia e Dadinho, católico que começou na Praça Maciel Pinheiro e eu tinha toda certeza que também ali também terminaria como tudo acontecia na nossa comunidade naquela época. Escute senhor Sadigursky, eu até imaginava duas alternativas possíveis:

A primeira, seria: UM BAITA FESTÃO DE CASAMENTO.

A praça cheia de gente, convidados por parte das duas famílias, ademais o pessoal conhecido da praça, os guardas noturnos da Delegacia do Aragão (naquele tempo tinha disso no Recife), a praça totalmente lotada e a paz reinava na terra e no céu.
As famílias dos noivos apaziguados, isso era o mais importante.
Um coreto todo iluminado com lâmpadas de todas as cores, a "Banda Acadêmica" tocando musicas de Capiba e também as suas, estimado "maestro" Sadigursky.
Baixo tua batuta a banda se transformaria nem que seja numa hora, em "Klezmerim" do leste europeu, tocando musicas judaicas alegres e que convidavam a dançar e saltitar no meio da praça.
Muita comida gostosa, bebidas e alegria sem limites.
A imaginação não foi tão longe, pois ainda não decidi quem os casaria, se um padre ou um rabino (entidade religiosa judaica), ou sabe os dois juntos, se na Igreja da Matriz com o dobrar dos sinos ou debaixo de uma "Hupá" (costume judaico), junto do secular pé de Jambo do Pará, na praça mesmo.
Neste aspecto ainda estou em duvida.
Imaginei muitos fogos de artifício, o céu todo iluminado com foguetes do ar de todas as cores, a meninada atirando "estrelinhas", jogando confetes e serpentinas.
Um verdadeiro mini-carnaval fora da época.

A segunda, seria: UMA TRAGEDIA a ESTILO ROMEU E JULIA.

Que Deus me livre e guarde senhor Sadigursky, porem imaginei também uma alternativa nesse estilo.
Pelos enormes problemas causados pelas famílias de credos distintos, a proibição de ambas as partes para a consumação deste casamento. Xóxa e Dadinho se suicidariam sentados abraçados junto à fonte da índia e os quatro leões, no centro da querida pracinha. Não poderia ser uma cena melhor para o desfeche desta tragédia.

Dois enterros cada um de um lado da praça, a praça totalmente cheia de gente chorando, pois os dois personagens envolvidos nesta tragédia eram conhecidíssimos pelos frequentadores e moradores desta Praça no Recife.
Um mundo de coroas de flores e flores ao natural acompanhava o ataúde de Dadinho que era católico, no de Xóxa nada, pois era judia e segundo o costume milenar deles o corpo vai numa mortalha e coberto com um manto negro com uma Estrela de David bordado e nada mais.
Um carro fúnebre seguido da comitiva dos carros acompanhantes partiria para o cemitério de Santo Amaro e a outra comitiva para o cemitério de judeus no bairro do Barro.
Os dois amantes (quando em vida) seguiam agora destinos diferentes e talvez só no paraíso se encontrassem e desta vez para eternidade.
Até aqui era a minha imaginação para o desenfeixe desse romance tão falado na comunidade israelita, naquela época do Recife matuto.
Até aqui era o que eu imaginava. Que acha vosmecê senhor Sadigursky?

Veja o que na realidade aconteceu.
Dadinho, católico foi enterrado no Campo Santo em Maceió e na laje dizia nada mais que:
DEMOSTENES ABELARDO MONTEIRO (Dadinho o nosso eterno amor)
Data de nascimento e falecimento.
Já Suzana (Xóxa), judia, ninguém sabe nada dela, Se virou religiosa ortodoxa na Antuérpia? Tem filhos? Quantos? O de Dadinho nasceu? Hoje já deve ser homem feito, será que ele sabe quem foi seu pai biológico? Será que Xóxa ainda vive? Será que voltou alguma vez de visita ao Brasil depois que a casaram com um jovem judeu da Bahia, contra sua vontade? Nada sabemos. Uma odisséia, insolúvel!

Veja só senhor Sadigursky, tudo começou com um namoro inocente na nossa querida Praça Maciel Pinheiro e deveria terminar aqui também.
A realidade é que Dadinho está enterrado em Maceió e Xóxa vive ou já não vive nas terras frias da Europa.
Esta é a minha frustração senhor Sadigursky.
O axioma pregava que na colônia judaica tudo que começava na pracinha também nela terminaria. Axioma, senhor Sadigursky, axioma, sabes que é axioma? Pois é!
Ele me olhou com os olhos rasos d água e me disse em iídiche:
"Bist a nar, far inz iidn, iz di Prace Macié Pinheire, di gontze velt".
 "TOLO, PARA NÓS JUDEUS, A PRAÇA MACIEL PINHEIRO É O MUNDO TODO".
O axioma continua de pé meu jovem, ainda mais o "axioma judeu" que não é limitado nem no tempo nem no espaço, ele é eterno como este povo!
 Olhei estupefato para este homem simples e humilde e "falei com meus botões":
-Vejam, vejam, o "Diógenes judeu", um filosofo de pés descalços que vivia entre e nós não sabíamos!

De mansinho, lagrimas deslizavam sobre as nossas faces.
Na ocasião passava o "marmiteiro", o senhor Malaquias, levando as mãos cheias de entregas para casas de família na vizinhança, um cheiro bom danado de comida judaica preparada na pensão do casal Volodia no primeiro andar, esquina da Rua do Hospício com a Rua Imperatriz era de deixar água na boca.
Bom que a meninada que brincava e corria atrás duma banda de Maracatu que ensaiava a sua bateria e as tubas, em volta da pracinha e logo seguia em direção da Rua do Aragão, não deu fé nestes dois adultos sentados num banco, chorando num dia tão bonito na Veneza brasileira e não por dor de dentes, mas era pura nostalgia e saudades!

TRECHO FINAL DA CRÔNICA "UM AMOR IMPOSSÍVEL" NO RECIFE MATUTO.
 Paulo Lisker - Israel.
(Todos os direitos reservados)
 Junho 2010    
  


  




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