sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

Segredos do "Quarto Escuro no IPÊ ROXO"

                       Fazenda IPÊ ROXO E OS "SEGREDOS DO QUARTO ESCURO"
                       (ILUSTRATIVO) - Google, Internet

PAULO LISKER,
 ISRAEL
(22-11-2010)                                  
"Um amor impossível" (parte 7).
"Borrador"

Tema: Segredos do "Quarto Escuro".

Dadinho estava estupefato, calado, escutando a narração do coronel sobre o encontro com o visitante o Lic. Efraim Castanheiras que vinha em busca de sinais remanescestes dos Judeus no nordeste do Brasil.
A revelação do conteúdo da caixa que ficara por mais de século encerrada  no "quarto escuro" da Casa Grande, o deixava atônito.
O coronel Barbosa relatava sobre o encontro com o licenciado.
Depois que trouxe a caixa do "quarto escuro", começou a retirar peça por peça com o maior cuidado do mundo.
Quase tudo estava embrulhado em papel ordinário e já estava se esfarelando pelo tempo e o clima semi-úmidos da região.
O Lic. Efraim limpou os olhos e as lentes dos óculos embaçados, pediu desculpas pela sua emoção inesperada, se pôs de pé junto ao coronel para sentir mais de perto cada nova surpresa que iam descobrindo a cada minuto ao retirar o conteúdo secular (ou milenar, quem sabe a idade exata), contido nesta caixa muito bem guardada no "quarto escuro" da Casa Grande da fazenda.
Primeiro, tirou quatro candelabros de prata pura, (identificados como tal, pela cor escura que recebeu com o passar do tempo), uns cálices e tinha um deles  maior e mais luxuoso, uma bandeja, tudo isso do mesmo metal. Iria dar muito trabalho danado para limpar e esfregar todas estas peças com o conhecido "kaol". 
Uma varinha de madeira preta (talvez de ébano) na sua extremidade uma miniatura de palma da não com o dedo indicador esticado, meia dúzia de xales de seda (alguns deles perfurados por traças,), caixinhas pretas e tiras de couro da mesma cor  pegadas a elas, uma serie de camisolas com 4 tranças em cada extremo inferior, 10-12 livros de reza bem embrulhados que assegurou uma relativa boa conservação deles, partes de ramos de plantas secas e uma delas era a folha ainda fechada de alguma espécie de palmeira,  pequeninos frascos vazios (parece que era de alguma essência) e uma boa quantidade de toucas pretas, algumas delas  bordadas com fio de cor doirada ou prateadas, com simples enfeites de frutas ou flores, não imagens  de humanos ou animais.
Dezenas de velas de sebo e algumas lamparinas de azeite.
De um saquinho de seda fina de cor bege caiu sobre a mesa uma dezena de objetos de cor marrom, pareciam pequenos tubos com uma letra indecifravel no meio da parte superior e nos dois extremos, furos como para pendurar na parede, o tamanho de cada artefato com uns 10 centímetros por 2 de largo.

Quando pensavam que tudo já estava fora da caixa, o coronel retirou os restos de papel e palha e teve a surpresa da sua vida.
Embrulhado em 3 envólucros de veludo azul (em hebraico "Kissui ha Sefer"),  bordados com letras hebraicas doiradas, um rolo de pergaminho, (HA TORÁ), amarrado com uma fita azul e branco.

O coronel olhou para o licenciado Efraim como se pedisse alguma explicação para o significado do mesmo antes de desatar os laços ou os nós da fita que amarrava aquele (rolo de pergaminho), objeto desconhecido e que só agora descobrira no fundo da caixa empoeirada, à luz do restinho de sol no fim da tarde.
O Licenciado, à medida que as coisas iam sendo descobertas, sussurrava para si mesmo, os nomes dos "objetos" que eram do seu conhecimento, assim como, do "povo hebreu" (judeus de hoje), e era uma herança de tempos mais antigos.
O Lic. Efraim, tanta era a sua tensão por presenciar este evento, que só Deus poderia lhe ocasionar, não tinha mais forças para se manter de pés, sentou-se  e disse:
-Senhor coronel vai buscar lápis e papel para anotar os nomes desses objetos que agora, depois de quem sabe quanto tempo, voltaram a reviver, saíram da sua anonimidade e quem sabe lá, do esconderijo propositado por seus donos, teus ancestrais.
Vá traga com que escrever e comecemos já a catalogar os "achados".
Assim foi, o coronel voltou com um caderno e dois lápis, uma borracha e uma gilete caso necessário.
O licenciado foi pegando com o maior respeito e cuidado cada objeto, como se fosse feito do mais frágil cristal do mundo.
Sussurrando, dizia para o coronel, que ia tomando nota.
-Estas caixinhas pretas se chamam "Tefilim", as correias, essas pegadas a elas são de um couro especial unicamente de tenras ovelhas (Or shel Sé,  Behemá Daká), olhe estes xales de seda, são "Talitot, com ele o que reza se envolve o que pratica a reza".
Estas toucas, sem elas na cabeça ou qualquer outro chapéu, por tradição não se deve rezar ou ler na Bíblia, estas toucas são a solução mais simples para tal. Elas se denominam "Kipót" ou "Yarminka".
O candelabro de nove braços é a "Menorá", usada nos dias da festa religiosa, a festa de "Hanucá". Cada noite durante oito noites se acende uma vela ou lamparina, ("Banu Laila Legaresh" que significa: "Viemos para expulsar a maldita escuridão"), o nono braço, este do meio do candelabro, é o lugar do "Shamás", aquele que é usado para acender as outras velas ao anoitecer nesses oito dias que se comemora esta festividade de Hanucá (Festas das luzes).
Os cálices de prata (Kossiot) são para tomar vinho em ocasiões especiais, festas religiosas, batizados (brit milá), noivados (Tnoim, em hebraico), etc.
O cálice maior e com altos relevos mais belos, é o do profeta Elias (koss shel Eliahu, em hebraico).
Existe uma  tradição milenar, deixar um cálice na mesa e uma cadeira vazia na ceia da Pascoa (Peissach) para um ente querido ausente.
Para que a família não fique triste com esta ausência nesta festa familiar, é praxe "crer" que o profeta Elias (Eliahu) viria em seu lugar e tomaria este assento vazio e brindaria a família presente com o tal cálice ali deixado para ele.
Por isso mesmo é costume também deixar a porta da casa aberta, para recebê-lo.

-Devagar, reclama o coronel, vosmecê está ditando muito depressa. "Eu assimilo rápido quando me explicam devagar" e deu uma gargalhada pelo ditado expelido de sua autoria. 
-Ta bem, tá bem, vou diminuir o ritmo, pro senhor coronel não reclamar mais, vamos adiante?

Dona Genoveva trouxe limonada para os "novos arqueólogos" e logo mais trouxe três candeeiros já acesos e disse que a ceia com mais meia hora estará postada na mesa e o quarto de pernoite para o  licenciado Efraim, já esta pronto, e se foi.
Ela não tinha nenhum interesse no que estes dois homens estavam de momento "pesquisando" e voltou a seus afazeres.
-Continuamos coronel?  
Pois bem, as velas que o senhor tirou da caixa se chamam "Neirot Hanucá", usada para este evento e as lamparinas de azeite, são usadas para serem acesas nos dias de memorias aos finados e se denominam "Neirot Neshamá".

Estas camisolas brancas de tecido vulgar, sempre o judeu ortodoxo veste para lembrar que nem sempre tinha boa roupa, isto se chama "Tsissit" e estas quatro trancinhas na parte inferior das camisolas se chamam "ptililim".

Está anotando senhor coronel?
-Tô, tô, sim senhor, pode continuar...

-Os livros de capa preta se chamam "SIDUR", a escrita em caracteres desconhecidos até o momento, isso pode ser hebraico, aramaico, ladino, grego, árabe ou qualquer outra língua onde os judeus permaneceram por mais de 1000 anos, e por conveniencia escreveram as rezas no idioma local. Não é comum, porem pode acontecer! Como ainda não folheamos, não poso identificar.

Adiante, a bandeja de prata (Tzalahat ha Seider), é para uso festivo, na Pascoa, porem, não só.
Nela coloca de uma maneira simbólica o que comeram no deserto ou sinais divinos  lembrados na Agadá (a lenda que é contada de geração a geração sobre a saída do cativeiro no Egito, comandados pelo Patriarca Moisés).
-Conhecia a "lenda" senhor coronel?
-Não, conte, conte senhor licenciado....

-Falo dos castigos que o Patriarca Moisés impôs ao Faraó que não permitia a libertação dos hebreus dos longos 400 anos de cativeiro. 
No fim ele conseguiu e levou o povo judeu embora de lá, atravessou o mar Vermelho em seco, a caminhada de 40 anos pelo deserto,  foi aí que receberam as Tábuas com os Dez mandamentos e depois disso, finalmente se assentaram na terra de Israel, como ordenado por Deus. Conhecia tudo isso senhor coronel?
-Não senhor, nunca ouvi falar disso não!

-Bom vamos pra adiante, este "pauzinho de ébano" é  um "mentor"         (Maré Makom ou Simaniá), que vai acompanhando as linhas das escrituras, para ajudar na leitura das rezas que realiza o "Hazan". (este que reza lendo as escrituras em voz alta para os demais,  na sinagoga).
Estes tubinhos com a letra em alto relevo e os furos nas extremidades, são "Mezuzot", isto se prega na armação da porta e serve de mascote para a bênção, dos que entram e quem saem da casa.
A letra que esta em alto relevo é a letra hebraica "shin" que significa "shadai", uma das denominações de Deus, para evitar usar o nome do Senhor a toa.

Os raminhos de plantas que secaram na caixa são remanescestes dos quatro vegetais que representam qualidades diferentes e cada um por si só, não é perfeito. Porem os quatro juntos são imbatíveis, isto como uma alegoria ao povo judeu, separados em tribos seriam facilmente derrotados, porem como é praxe dizer: "A união faz a força", assim também quando estão os quatro "matinhos" juntos, não se consegue romper o fecho formado, assim também o povo judeu. Coisas de tradição milenar! 
Estes ramos secos de vegetais é praxe colocá-los na mesa da festa de "Sucot", (Tabernaculo) quando o povo tem por obrigação viver uma semana numa cabana com o teto de palha, para fazer sentir a aqueles que já possuem tudo, como se sentem os pobres que não tem sequer um teto humilde para se abrigar.

O coronel Barbosa, parecia que aprendia coisas que seus antepassados esconderam e nunca transmitiram as gerações subsequentes.
Coisa totalmente estranha ao judaísmo que preza e conserva este principio de transmitir por milénios para nunca esquecer.
Muita coisa na Bíblia, explica o licenciado, não consta abertamente ou não está suficientemente explicado.
Estas emendas ou interpretações feitas por patriarcas, profetas, juízes, grandes rabinos e estudiosos no passado longínquo (Hahamim, Gaonim, Iluim, Poskim), interpretaram, e transmitiram tais emendas em documentos escritos ou oralmente, de geração a geração, durante milénios. No decorrer destes milénios  não se mudou ou acrescentou nem sequer uma vírgula, palavra ou letra.
Por isso, mesmo que dispersos durante 2000 anos, a Bíblia 
(HA TORÁH), é a mesma, aqui na China, na Rússia,  ou em qualquer outra parte do mundo onde ora o povo Judeu.   
O licenciado Efraim, respirou fundo e como estivesse implorando, exclamou:
-"Agora senhor coronel, deixe-me tratar de abrir com o máximo cuidado este rolo de pergaminho, isto para não inutiliza-lo para usos sacros no futuro".
O coronel cedeu passo e afastou-se do "pacote misterioso".
 O licenciado fez o máximo possível para tratar deste "achado" como se fosse um paciente na sala de intervenção cirurgia das mais delicadas.

Fim da parte "7"  ("Segredos do Quarto Escuro") do relato:
"UM ROMANCE IMPOSSÍVEL"
 A parte (8) versará sobre o tema "O misterio da TORAH" 






9 comentários:

  1. Eng. I. Coslovsky São Paulo-Brasil
    DISSE:
    Paulo
    Muito bom, v. vai re escrever o Amor ImpossÍvel? Lembro que foi das primeiras peças literárias que V. me enviou, e foi muito apreciada...
    Um ABRAÇO
    ISRAEL

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  2. Lic. R. J. Mayer - Rio de Janeiro
    DISSE:
    Grande Paulo !
    Muito obrigado pela sua resposta.
    Vou ler com carinho o texto e ver no que dá.
    De todo modo, pensei que você estivesse priorizando, para futura
    publicação, o "Incidente em Guararapes" e seus três desdobramentos.
    Informe, por favor, se é isso mesmo.
    Abraços
    Renato
    P.S. - Acho que preferiria estar na Terra Santa do que nessas terras cariocas impactadas por um calor infernal que dura já quarenta dias ! E com chuva de um dia só.

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  3. Dr S. Hulak Recife
    DISSE:
    Paulo,a seu pedido informo que recebi,por sinal,pela segunda vez sua crônica.
    Abraço,
    Samuel.

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  4. Eng. Roberto Muchnick Israel
    Disse:
    Paulo, shalom
    Acabei de voltar do Brasil, li e achei muito interessante.

    Um abraco
    Roberto

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  5. Ator Germano Haiut Recife
    DISSE:
    CLARO, "si is a fargueniguen. ABRAÇÃO.

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  6. Sra. Simone Zimilis Recife
    Disse:
    Oi Paulo bem interessante, como esse caso existem muitos pelo nordeste afora, inclusive há alguns anos atrás foi feito um documentário sobre o assunto com muitas entrevistas e fatos curiosos , tais como um padre no interior do Ceara e uma cidadezinha no interior da Paraiba em que a descendencia vem pelo lado materno de cristãos novos e que respeitam certos costumes judaicos, Senha, meu falecido primo conhecia muito bem histórias desta natureza.Um abraço Simone

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  7. Eng Agr. I. E. Lederman Israel
    DISSE:
    Paulo, Shabat Shalom
    Graças a D'us, a sua verve literaria não se limitou, apenas, em relatar, em cronicas, o Recife judaico ou matuto (como vc. prefere chamar), do qual vc. e sua familia foram agentes centrais nessas historias. Agora vc. nos brinda como mais essas cronicas e nos revela, em seu conteudo, a sua vocação tb. como excelente contista.
    Muito bom, Paulo.

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  8. Sra. B. Rushansky Recife
    DISSE:
    Parabéns, a Torah esta bem apresentada, Shabat Shalom

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  9. Eng.Izaias Rosenblatt Recife
    DISSE:
    Isso não é um romance impossível.
    Essa é a estória de boa parte do povo do Nordeste. As raízes e heranças judaicas são mais do que evidentes e árabes também. Muitas vezes recordados por objetos, na maior parte por documentos e na ausência deles por rituais e tradições milenares que se perpetuaram de uma forma ou de outra com elos perdidos no meio devido a Inquisição, são os chamados memes socioculturais.

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