SÁBADO, 1 DE JUNHO DE 2013
O time de Júlio "Magro" e Rubão
Foto 1, o time de garotos judeus do Recife. Equipe MAAPILIM.
Da direita, de pé: Uziel Mutchnick (falecido), Rubão (Rubem Pincovsky) Recife, Jaiminho (Mario Jayme Zimilis, falecido), Paulo Lisker (Israel), Itiel Bubman (falecido), Moishe Kertzman "fumaça", falecido.
Agachados: Bernardo Katz, Nadinho, Recife, Zildo Faierstein (falecido), David Bogater Jacubovitz, Vivi (falecido), Julio Charifker (Julio magro, falecido), Walter Ghelfond (Vauty, falecido).
Foto: Paulo Lisker
O TIME DE JULIO "MAGRO" E RUBÃO (Meia direita e Pivô, respectivamente)
Paulo Lisker, de Israel
26-05-2013
Parece que já disse em alguma crônica anterior que a comunidade de imigrantes judeus chegados ao Recife nos fins do século XIX e no principio do século XX, não geraram nem cronistas nem futebolistas afora raríssimas exceções. Futebolistas: Dois. Assim como as andorinhas que aparecem cedo demais e não trazem o verão.
Cronistas: Nenhum mesmo. Tenho plena certeza.
Se tivessem aparecido naquele tempo, estas crônicas hoje, seriam coisas caducas.
O nosso desejo hoje é contar sobre um tema que dele não ficou nada ou quase nada registrado.
Assim sendo, não ficou do conhecimento publico, os intentos da juventude judaica, filhos de imigrantes, a vontade de se assimilar (assemelhar) ao povo local (os goim), pois para isso era necessário saber jogar futibó (Foot Ball).
Vocês já viram menino brasileiro nato, que não corre atrás de uma bola mesmo que fosse de pano e cheia de papel? Não tem!
Hoje sabemos que a primeira tentativa para tal "façanha", data dos anos vinte.
Alunos do "Colégio "iídiche" Israelita", formaram um time que até participou no campeonato pernambucano de futebol.
Da pouca informação existente, grande time nunca foi.
Nos poucos anos de participação apanhou tantas "surras" (grandes derrotas), até que desapareceu por completo.
O fim destes garotos, todos sabemos qual foi.
Ao deixar de lado o sonho do futebol, esta gente foi estudar e se formar nas universidades do Recife.
Era uma "mitzvá" (compromisso divino) dessa gente para com seus pais e seu povo. Desde novinhos viviam agarrados ao livro pra conhecer as letras, saber ler e escrever e deixar o analfabetismo para longe e "virar gente" (Zain a mentsch, em iídiche).
O Israelita Futebol Clube, fundado em 1922, deixou de existir um par de anos mais tarde*, para a felicidade geral das mães desses garotos que desejavam que eles terminassem de estudar medicina, engenharia, arquitetura ou mesmo dentista, o importante que fossem "a docter" (diploma de doutor).
Só assim teriam um futuro melhor que os seus pais, que chegaram ao Recife "com uma mão na frente e outra atrás", uma maneira de dizer que chegaram sem um vintém, com a roupa do corpo, sem saber o idioma local e pensavam que conviveriam com índios nativos e selvagens.
A verdade era que esta geração de imigrantes tinha muita vontade de vencer a todos e quaisquer obstáculos no novo continente. Criar um novo lar, livre das perseguições da igreja européia e seus correligionários fanáticos cristãos fundamentalistas.
Quando se deram conta que a meninada estava assimilando os costumes locais, entre outras, a pratica do futibó, coisa de moleques da rua, quase enlouquecem.
Foi mais um "imposto" cobrado a estes imigrantes e um preço bem pago pela segunda geração na corrida pela assimilação ao sistema da vida local. Não só feijão com arroz, relegando a comida judaica tradicional, a coisa foi pra mais longe, tamancos, dormir em redes, namorar com "shikses" (não judias), adorar comida local não casher (matéria prima e preparo, segundo manda a religião judaica), não rezar ou guardar o sábado. Era se despir de tudo que fosse a cultura e as tradições dos antepassados.
Tudo se volatilizava com o correr do tempo.
Quando o time de futebol se acabou e esta doidice de viver chutando bola nas campinas da cidade, os veteranos, nossos pais e avós respiraram descansados. Finalmente, não mais o futibó dos goim. Agora arregaçar as mangas e estudar e trabalhar.
Houve mais uma tentativa no fim dos anos trinta, quando o sargento Barreto, o instrutor de educação física do colégio israelita, pensava em formar uma equipe de futebol juvenil para competir com outras escolas primarias da cidade.
Ele prometeu aos meninos que pediria ajuda à Buchada (José Bushatsky, jovem judeu, ex goleiro do Sport F. C. da Primeira Divisão do futebol pernambucano) e a seus colegas Tará e Guaberinha do Santa Cruz (já aposentados), para que lhe dessem "uma mãozinha" (ajudassem), pois o sargento não era entendido nas regras deste jogo.
Nos meninos da escola iídiche (judaica), despertou grande interesse, porém afora uma reunião de motivação com o Buchada (José Bushatsky) o projeto não vingou (realizou).
O time da escola Israelita ficou só na promessa.
As fotos hoje postadas nesta croniqueta, foram tomadas muitos anos depois, já no fim dos anos 40 do século XX.
Foi uma terceira tentativa de formar um time juvenil de jovens judeus.
Agora não era no intuito de assimilação aos costumes locais, muito pelo contrario era um intento de reunir e incorporar a juventude judaica, no movimento sionista de esquerda o "Hashomer Hatzair" (A Jovem Guarda), preparando-os ideologicamente e fisicamente para uma vida nos assentamentos agrícolas em Israel.
Era a redenção das terras desérticas da Palestina.
Preparar aquela área no médio Oriente, abandonada e descuidada pelos que por ali perambulavam e assim poder absorver milhares de refugiados judeus, sobreviventes da carnificina nazista, nos infames campos de concentração e os fornos de crematórios humanos.
Seria finalmente a concretização da mensagem bíblica, "a volta do povo preferido" para sua terra natal, depois de 2000 anos de exílio na diáspora.
O time de futebol era um mero pretexto, porem a garotada via nesta formação do time de futebol algo maior que a realização sionista em Israel.
Os "craques" futebolistas constituíram a equipe denominada Maapilim (em hebraico, "Escaladores") e jogavam contra outras equipes dos diversos bairros e ruas do Recife.
O nosso orientador e técnico era o "chaver" (camarada) Ary Ruchansky que nos imbuia também das teorias revolucionarias e sionistas daquela época.
Lembro-me dos campos e campinas que disputávamos as partidas amistosas. Estas eram acordadas dois a três dias antes da contenda e se chovia muito a partida (jogo) era cancelado de comum acordo por ambos os times (equipes).
A campina da Ilha do Leite (de terra), campo da escola Técnica do Derby com gramado e redes, campo quartel da Escola da policia militar do Derby (gramado de primeira e redes), campo da Escola de Agronomia USAP, em Dois Irmãos (arquibancada, banheiros, gramado, redes e até linhas demarcatórias).
Às vezes ganhávamos e às vezes perdíamos, às vezes tristes com a derrota e às vezes alegres com as vitórias, se dava empate nos confraternizamos com o adversário, mas nem sempre estes gostavam de se abraçar com a "judeusada" do time que não os deixou ganhar a partida e xingavam a bessa. Dava até medo.
Possuíamos nossas próprias pelotas compradas na Casa Sport ou do Atleta, aquelas de numero cinco de cor alaranjada, era a moda na época e não branca como atualmente.
Quase ia esquecendo, tínhamos uniforme com emblema do nome do time "MAAPILIM" e jogávamos descalços ( Ver fotos).
Meu Deus do céu, quantos artelhos (dedos dos pés) deslocados, calcanhares inchados, água nos joelhos, empurrões, pontos na cabeça cuja cicatriz fica para toda vida, palavrões pejorativos para com as mães dos jogadores e os juizes. Estes em grande parte eram nossos amigos, que nos acompanhavam para ver as partidas e eram nomeados "in loco", juizes da contenda.
Senha (Alexandre Ribemboim), era um juiz muito bem conceituado por todas as equipes pelo seu grande conhecimento das regras do "Foot Ball Association". Quando ele não estava presente por essa e aquela razão e os dois times não concordavam com a escolha do juiz, então atuava no campo até dois juizes, um de cada time, cada qual responsável pela metade do campo e não era nada mal, até que dava certo. A imparcialidade era meio duvidosa, mas o que não se faz pelo amor ao futibó.
Éramos garotos cheios de vida, até inventávamos umas "regrinhas" próprias.
Às vezes atuavam dois juizes, sem bandeirinhas, sem impedimento (ficar esperando passes na "banheira"), sem cartão amarelo, etc. Jogávamos pela camisa e o emblema nela estampado e pra que mais?
Tínhamos um par de jogadores reservas.
Zeca Guitsis, avisou-nos que jogaria bola conosco, porém não faria "aliá" (viajar para a "terra Santa").
Outro era Meira (Mauricio Bucuar), reserva "só pra inglês ver", pois estava registrado oficialmente no time juvenil do Sport F.C. que proibia terminantemente sua participação em torneios alheios, pois caso se contundisse, seria expulso do clube. Porém ele às vezes nos acompanhava nos jogos, ficava no "banco dos reservas" só para meter medo aos adversários como se fosse a nossa "arma secreta" e que logo mais substituiria ao Itiel Bubman, que de tanto dar empurrão poderia ser expulso, fora disso, ele não utilizava os dois pés e Meira tinha esta grande vantagem, ademais caso houvesse pancadaria ele nos ajudaria a sair são e salvo.
Tudo isso acabou, alguns do nosso time e o instrutor Ary, foram por em pratica o tal socialismo agrícola em Israel (Kibutz).
Outros quando assistiram no salão da sociedade Israelita um documentário filmado num Kibutz de brasileiros (Kibutz Bror Hail), uma cena que mostrava um rapaz do Rio, no verão calorento, cortando pasto com uma alfanje e num close up, o cameraman o pega com um trapo de pano enxugando o suor que corria no seu rosto, foi suficiente para a tomada de decisão de abandonar a idéia louca de ir se meter a ser agricultor em Israel.
-Ta louco, melhor mesmo é ficar tomando uma brisa, sentado numa espreguiçadeira comendo "casquinho de siri", tomando uma água de coco bem fria na praia da Boa Viagem, não é mesmo minha gente? Nós somos a "banda fraca", criados para o amor, sionismo que façam os fortes.
FIM DO SONHO.
* Dados do artigo do Dr. Mizrachi, publicados no Diário de Pernambuco.
Foto 2, após a derrota frente o time dos garotos italianos PAPALEO.
A nossa equipe sem vontade de pousar para a posteridade.
Deitado diante da equipe o nosso "menager" (menahel) Ary Ruchansky. Vive em Israel.
Fotos da coleção de Paulo Lisker.
Todos os direitos autorais reservados.

Clóvis Campelo Recife
ResponderExcluirDisse:
Já está no blog e no Facebook, Paulo, no nosso grupo.
Abraços
Dr. Ary Rushansky Israel
DISSE:
Reconheci uma boa parte dos meus discipulos, principalmente os que já não estão por aqui. ary
Shulamita Bushatsky Brasil
Disse:
Muito bom!!!
Grata
Sulamita Bushatsky
Dr. M Rosenblatt Israel
DISSE;
Interessante, todos os meninos naquele tempo eram magros, quase raquiticos. (veja as fotos)
Não havia Bisli-Bamba nem tampouco McDonald’s.
Mas tinha caldo de cana (açucar pra caralho!!!) e Sonho-de-Valsa...
Mauro e Lora Kibutz Gvat Ozz Israel
Disse:
Paulo obrigado.
Quase não conheço ninguem.
Mauro
Eng. Roberto M. Israel
Disse:
PAULO SHALOM
CHEGOU
ABRAÇOS
Dr. Jacques Ribemboim Recife
DISSE:
Paulo, recebi, li e achei formidavel.
Parabéns!
Abraços, Jacques Ribemboim, filho de Senha.
PS: Meu pai manda lembrancas.
Dr. Rosali Naslavsky Brasil
DISSE:
Paulo,
obrigada por mais uma crônica do passado da nossa comunidade.
Papai,José Bushatsky,dizia que ficaria mais conhecido pelo goleiro que foi,do, que pela carreira de engenheiro civil,que tão bem desempenhou.Abç
Chochana
Paulo Lisker Israel
DISSE:
Espero que vosmecê não ficou magoada com o escrito sobre seu pai.
Na realidade, foi um goleiro que mesmo depois que ele abandonou o Sport e foi estudar engenharia ao de escalar o selecionado pernambucano o nome de Zezinho (Buchada) vinha a tona, pois diziam que a experiencia e a colocação dele, nenhum outro em Pernambuco herdou.
Conquanto na sua profissão de engenheiro o livro que sua mãe escreveu (e me mandou e eu lí até o fim), não dava mais lugar para elogiar e com toda razão as obras que ele realizou e alunos que formou na universidade onde lecionou.
Um abraço.
Sra M Steinberg Recife
ResponderExcluirDISSE:
Oi Paulo.
Tudo de bom para vocês.
Li sua crônica sobre o futebol com as fotos.Gostei muito.
Obrigada
Eng. I. Coslovsky São Paulo-Brasil
DISSE:
PAULO
MUITO BOM, COMO SEMPRE.
UM POUCO NOSTALGICO, MAS UMA LEMBRANÇA PRECIOSA.
UM ABRAÇO
NECO
Izaias Rosnblatt Recife
DISSE:
O Ary e a Lea sempre foram minhas referencias. Gosto de todos os Rushanskis e Abramovs.
O Meira e o Itiel Bubman conheci muito bem. O sogro de Meira construiu o meu prédio, o Sr. Moyses Ferman. O irmao do Itiel, o Same foi meu colega de escola. Do time iidishe a turma jovem não tem mais lembrança. O pai de Chochana, minha colega, o grande Butchatsky era uma figura. Eu também gostava muito do pai dele, o Seu Benjamim, sempre contando uma piada para os velhos no shil.
Vc iria ter um susto de ver a campina da Ilha do Leite hoje em dia. Coalhada de hospitais e clinicas e prédios futuristas na beira do canal que liga a Tacaruna ao Capibaribe entre o Coque e os Coelhos.
O Recife foi todo ocupado e quase não tem mais lugar pra se jogar futebol.
a Casa do Sport ainda aguentou até o inicio dos anos 70. A Casa do Atleta aguentou mais até os anos 80 quase 90. Aí veio a revolução das megalojas de material esportivo que são imensas, e que tem tudo de mais moderno em todas as atividades esportivas, e consultores que aconselham qual o melhor material para cada tipo de pessoa.
É bom que vc escreva essas crônicas de sua época, como eu pretendo escrever as da minha, para recordação das futuras gerações que ao chegarem encontraram tudo pronto...
abcs
Paulo Lisker Israel
Disse:
Obrigado pelos vossos comentários.
Não sejam lacónicos, critiquem caso necessário, pois assim um aprende.
De qualquer maneira agradeço.
Paulo
Dr. S. Hulak Recife
DISSE:
Paulo,grato pelos nomes;estranhei a ausenciados irmãos Mandel
e do Alexandre "pixilinga" Fishman,alem do Roberto Botshkis;eles
não fizeram parte do time?
Recebi a como sempre ótima crônica "O incidente Guararapes".
Sobre este "fato" não soube nada.
Abraços,
Samuel.
22 de julho de 2013 07:28 Excluir
Blogger Passiflora disse...
Paulo Lisker Israel
DISSE:
Estimado Hulak,
Parece que estes que você cita não estavam no Hashomer naquele tempo.
Do "pixilinga"me lembro porem ele sempre foi "auto didacta" e nunca quis pertencer a organização nenhuma.
Eramos tão poucos que o time eram 11 jogadores e nem um substituto na reserva.